Mediação empresarial: uma alternativa que deve ser considerada na resolução de conflitos

Gradativamente, as empresas brasileiras têm cogitado o uso da mediação para a resolução de conflitos. Trata-se de mecanismo conciliador fundamentado na cooperação entre as partes, propiciando um ambiente colaborativo em que os atores do problema podem dialogar de maneira produtiva, expondo seus interesses com o escopo de alcançar o desfecho da discussão da forma mais satisfatória possível para ambos.
O estudo “Mediação em Números”, realizado pela parceria entre o Canal Arbitragem e a FGV Direito SP, mostrou que, levando em conta os dados sobre mediações realizadas em sete câmaras ao longo dos últimos dez anos (2012-2022), o salto na utilização empresarial da mediação é considerável.
Segundo a pesquisa, enquanto no ano de 2012, as sete câmaras examinadas, juntas, receberam 26 requerimentos de mediação, ao revés, em 2020, foram 120 requerimentos. Os números representam um salto de mais de 400%.
Todavia, no contexto pandêmico, a realização da mediação de forma online ganhou prestígio, fato que se manteve mesmo com o desfecho da pandemia, levando em consideração a redução de custos e as facilidades que o mundo virtual é capaz de proporcionar.
Vale destacar que o estudo também levantou a informação de que a mediação vem sendo usada após a instauração da arbitragem, nas fases instrutória e após a sentença parcial. Segundo a pesquisa, as Câmaras têm refletido sobre formas de incentivar a mediação no curso da arbitragem, concedendo descontos nas taxas de administração quando seu uso é realizado de forma concomitante.
Não obstante, no que se refere aos temas que mais se insurgem na mediação, são eles os contratos empresariais, demandas societárias, construção civil e energia – e, mais recentemente, as recuperações judiciais.
Tanto é verdade que, recentemente, em sua 10ª Sessão Ordinária de 2023, o CNJ, sob a presidência da Ministra Rosa Weber, lançou o Manual Prático de Mediação Empresarial, idealizado no âmbito do Fonaref – Fórum Nacional de Recuperação Empresarial e Falências. A obra pretende servir de referência para mediadores, advogados, juízes, membros do Ministério Público, administradores judiciais e toda a comunidade jurídica na prática da mediação empresarial nos processos de insolvência.
Dividido em quatro partes estratégicas, o manual visa contribuir para a edificação de uma perspectiva de expansão de uma política pública judiciária de tratamento adequado dos conflitos, voltada às especificidades da recuperação e falência de empresas.
Além de representar uma provável solução mais razoável para os interesses de ambas as partes, a grande vantagem da mediação consiste no afastamento da discussão no âmbito do Poder Judiciário que, em razão do exacerbado volume de demandas, acaba por ensejar processos duradouros, que, quando complexos, frequentemente se arrastam por décadas. Enquanto isso, a pesquisa em comento aponta que a média de duração dos procedimentos de mediação fica entre um a 387 dias.
Desta forma, a mediação se mostra como uma ferramenta mais coerente e ágil para a resolução de conflitos, sendo imprescindível a atuação dinâmica e diligente dos advogados das empresas, de modo a oportunizar, não tão somente o menor prejuízo possível, mas também a maior vantagem factível – tudo isso, de forma célere. Afinal, nas palavras de Ruy Barbosa, justiça tardia não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta.
Por Giovanna Semprini Ferreira, Advogada no Braga & Garbelotti – Consultores Jurídicos e Advogados.
Fonte: Migalhas – 19 de agosto de 2023.
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Da possibilidade de mediação em matéria tributária

A mediação, cada vez mais valorizada no sistema jurídico brasileiro, inclusive na área tributária, é um método autocompositivo de resolução de conflitos (uma espécie do gênero Alternative Dispute Resolution —ADR), no qual as partes resolvem por si mesmas a ameaça ou crise na realização do direito.
Tratando-se de autocomposição, as partes podem resolver a lide de forma espontânea, como ocorre na transação, no reconhecimento jurídico do pedido e renúncia do direito, ou de forma estimulada, cabendo aqui a conciliação e a mediação. Assim, em razão das múltiplas opções para a resolução da lide, cunhou a doutrina de chamá-lo de sistema de justiça multiportas, onde convivem algumas formas de solução dos conflitos, como a conciliação, a mediação e a arbitragem (esta, uma heterocomposição).
O termo multiportas deve-se a uma metáfora: “como se houvesse, no átrio do fórum, várias portas; a depender do problema apresentado, as partes seriam encaminhadas para a porta da mediação, ou da conciliação, ou da arbitragem, ou da própria justiça estatal” [1].
A ministra Regina Helena Costa, ao abordar o instituto da transação previsto no artigo 171 do Código Tributário Nacional (CTN), consignou a necessidade de veículo legislativo para tratar da autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública, dada a indisponibilidade e a supremacia do interesse público sobre o particular [2].
O CPC de 2015 determinou a criação, pelos tribunais, de centros judiciários de solução de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mormente a Resolução nº 125/2010, que instituiu a Política Nacional de Conciliação e a Política Nacional de Mediação, aplicáveis ao Poder Judiciário.
Embora seja voltada para a mediação em geral, essa resolução tem aplicação na prática da mediação tributária realizada pelos tribunais brasileiros, estimulando a sua utilização como meio alternativo de resolução de conflitos.
A Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002, instituiu normas gerais para a cobrança judicial e administrativa da dívida ativa da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Embora não mencione diretamente a mediação, prevê a possibilidade de celebração de acordos de transação ou de parcelamento entre o devedor e a Fazenda Pública, o que pode incluir a utilização da mediação como meio de negociação.
A Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015 (Lei de Mediação), traça as diretrizes gerais para a mediação aplicáveis a diversas áreas, incluindo a tributária. Embora não trate especificamente da mediação tributária, a lei estabelece, em substancial avanço, que a mediação pode versar sobre direitos disponíveis ou direitos indisponíveis que admitam transação, devendo, no último caso, o consenso ser homologado em juízo, exigida a oitiva do Ministério Público.
Menciona, outrossim, que nos casos em que a controvérsia jurídica seja relativa a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal ou a créditos inscritos em dívida ativa da União, as câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos, no âmbito dos respectivos órgãos da Advocacia Pública, não poderão celebrar termo de ajustamento de conduta e as empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços em regime de concorrência não poderão submeter seus litígios com órgãos ou entidades da administração pública federal à Advocacia-Geral da União, para fins de composição extrajudicial do conflito.
Quando as partes forem órgãos ou entidades de direito público que integram a administração pública federal, a submissão do conflito à composição extrajudicial pela AGU implicará renúncia do direito de recorrer ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e a redução ou o cancelamento do crédito dependerá de manifestação conjunta do advogado-geral da União e do ministro da Fazenda.
Em 2021, sobreveio, em inovadora disposição, a Recomendação CNJ nº 120, de 28 de outubro de 2021, mencionando o tratamento adequado de conflitos de natureza tributária, quando possível, pela via da autocomposição. Destarte, indicou aos magistrados com atuação nas demandas que envolvem direito tributário que priorizem, sempre que possível, a solução consensual da controvérsia, estimulando a negociação, a conciliação, a mediação ou a transação tributária, extensível à seara extrajudicial, observados os princípios da Administração Pública e as condições, os critérios e os limites estabelecidos nas leis e demais atos normativos das unidades da Federação.
No ano de 2022, por ato conjunto do presidente do Senado e do Supremo Tribunal Federal, foi designada uma Comissão de Juristas, responsável pela reforma do processo administrativo e tributário nacional, objetivando apresentar proposições legislativas tendentes a conferir eficiência aos procedimentos e criar instrumentos para a desjudicialização do processo administrativo e tributário. Entre as medidas, foi apresentado o Projeto de Lei ordinária, PL nº 2.485/2022, instituindo a mediação tributária na União como meio de prevenção consensual de conflitos em matéria tributária administrativa e judicial entre a Fazenda Pública Federal e o sujeito passivo.
Nos termos da redação original do anteprojeto de lei, nas hipóteses admitidas pela legislação federal, serão priorizadas mediações entre a Fazenda Pública Federal e a coletividade de sujeitos passivos, representados por entidades de classe, associações ou grupos detentores de situações idênticas ou análogas, visando à solução conjunta ou coletiva de conflitos relacionados à matéria tributária.
Quanto ao procedimento, o projeto de lei determina que as hipóteses de cabimento da mediação tributária serão definidas em ato conjunto do advogado-geral da União e do ministro da Economia, visando à pacificação da relação tributária entre fisco e sujeito passivo, sendo que a definição dos conflitos administrativos e judiciais em matéria tributária que poderão ser objeto de mediação seguirá os juízos de conveniência e oportunidade da Fazenda Pública, visando à recuperação das receitas não recolhidas espontaneamente pelos sujeitos passivos ou ao reconhecimento de desoneração total ou parcial desses.
A mediação tributária tem como objetivo principal a busca de soluções consensuais e cooperativas para as disputas fiscais, oferecendo benefícios tanto para a Fazenda Pública quanto para os contribuintes, permitindo a busca de soluções individualizadas, a redução de litígios, a economia de recursos e a preservação das relações comerciais entre as partes. De tal modo, o estabelecimento de um diálogo construtivo e a busca por soluções cooperativas podem ser vantajosos para as partes.
Como parte envolvida em uma disputa tributária, a Fazenda, que também é a responsável pela administração e cobrança dos tributos federais, deve buscar proteger os interesses do Estado, garantindo a correta aplicação da legislação tributária e a arrecadação dos tributos devidos.
No ano de 2022, foi apresentado o Anteprojeto de Lei Ordinária de Mediação Tributária da União nº 2485/2022 (PL da Mediação), com a finalidade de estabelecer a possibilidade de utilização da mediação visando à pacificação da relação tributária entre o fisco e o sujeito passivo e garantir a possibilidade de uso da mediação a partir da confluência de interesses da Secretaria da Receita, dos procuradores da Fazenda Nacional e dos sujeitos passivos.
O projeto estipula que a mediação será exercida por pessoas internas e/ou externas à administração pública e ressalva que, eventuais responsabilizações dos mediadores internos (auditores fiscais da Receita e procuradores da Fazenda), somente responderão por dolo ou fraude perante seus órgãos correcionais ou disciplinares.
Um aspecto interessante diz respeito à possibilidade de a mediação ser requerida não apenas pelo sujeito passivo, mas, também, pela Fazenda. Nos dois casos, a autoridade indicará quem será o mediador, e o sujeito passivo poderá rejeitar tal indicação por até duas vezes. Caso ainda discorde das indicações, poderá desistir da mediação.
[1] CUNHA, Leonardo Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 894.
[2] COSTA, Regina Helena. Código Tributário Nacional Comentado: Em sua moldura constitucional. 3. ed.. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2023, p. 390-391.
Por Ana Claudia Borges de Oliveira, conselheira titular da 2ª Seção do Carf, especialista em Direito Tributário e Finanças Públicas pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), foi professora voluntária de Direito Tributário na Universidade de Brasília (UnB) e é pesquisadora do Grupo de Pesquisa ProLaw-Lab – Precedentes, Democracia e Direitos Humanos (UnB) e do Grupo de Pesquisa Observatório da Macrolitigância Fiscal (IDP).
Fonte: Portal Contábil SC – 25/07/2023.
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Métodos alternativos de soluções de conflitos em matéria ambiental

Construção de hidrelétricas, abertura de estradas interestaduais que atravessam parques florestais, contaminação do solo e de lençóis freáticos, depósito de resíduos sólidos, contaminação por substâncias químicas tóxicas na agricultura, atividades mineradoras — esses são alguns exemplos dentre os vários impactos causados ao meio ambiente decorrentes da ação do homem ao longo do tempo e que, geralmente, têm sido dirimidos com a intervenção do Poder Judiciário.
A crescente preocupação com a preservação ambiental tem levado cada vez mais pessoas a buscar outros meios para solucionar conflitos relacionados ao meio ambiente.
A busca por uma solução rápida, efetiva e consensual tem levado as partes a optarem por alternativas como mediação, conciliação, negociação e arbitragem, visando a preservação do meio ambiente e a busca de um equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental, tudo de forma sustentável.
Nesse sentido, os métodos alternativos de solução de conflitos, os Mascs, se mostram uma ferramenta eficaz para alcançar uma solução justa e satisfatória para todas as partes envolvidas, assim como já ocorre em outros países, seja na resolução de conflitos instalados ou na sua prevenção.
Os Mascs se baseiam, em geral, em técnicas de negociação, mediação, conciliação e arbitragem.
A negociação é uma técnica utilizada para a resolução de conflitos em que as próprias partes interessadas dialogam para alcançar um acordo, sem a necessidade de um terceiro como facilitador, mas podendo se fazer representadas, por exemplo, por seus advogados.
A mediação consiste em um processo no qual um terceiro imparcial, o mediador, auxilia as partes a elas mesmas chegarem a uma solução consensual para o conflito.
A conciliação, por sua vez, é um processo semelhante ao da mediação, porém a diferença é que um terceiro imparcial, o conciliador, tem uma participação mais ativa, podendo ele propor soluções, alternativas, para que as partes analisem individualmente se é vantajoso para si, de acordo com seus interesses, e para a resolução do conflito.
Já a arbitragem é um processo em que as próprias partes escolhem um terceiro imparcial, o árbitro, ou um tribunal arbitral, de acordo com sua experiência profissional e capacidade técnica, para decidir o conflito de forma definitiva e vinculante com base na legislação aplicável ao caso.
Em geral, os Mascs apresentam diversas vantagens em relação ao processo judicial, tais como a celeridade, a eficácia, a economia de tempo, de gastos e a possibilidade de as partes escolherem um profissional especializado no assunto. Além disso, todas elas permitem uma solução mais flexível e criativa para o conflito, uma vez que as partes têm mais liberdade para negociar e propor soluções que atendam aos seus interesses, destacando a prática colaborativa de todos, a redução dos custos, a preservação do relacionamento entre si, e em matéria ambiental, possibilita alcançar soluções mais sustentáveis para a redução e prevenção de danos ao meio ambiente.
Além disso, é importante lembrar que o Direito Ambiental demanda cooperação, interdisciplinaridade, ampla participação dos envolvidos e acesso à informação, o que pode ser efetivamente garantido pelos Mascs, pois eles favorecem o restabelecimento do diálogo entre os participantes, promovem a troca de informações para o alcance de soluções criativas voltadas à preservação, à proteção do equilíbrio do meio ambiente e ao desenvolvimento econômico e social, garantindo a sadia qualidade de vida pelo meio ambiente ecologicamente equilibrado, econômico e socialmente sustentável, que fica, assim, preservado para as presentes e futuras gerações.
De outro lado, não podemos deixar de lado que o uso dos Mascs em matéria ambiental obrigatoriamente deve enfrentar a discussão acerca da natureza jurídica dos interesses tutelados, que podem ser difusos, coletivos e individuais homogêneos, envolvendo direitos disponíveis ou não, o que implica refletir sobre a possibilidade de as partes envolvidas poderem transigir sobre os mesmos.
Para tanto, considerando que a legislação ambiental brasileira é considerada uma das mais completas e avançadas do mundo, devemos utilizá-la em conjunto com as demais leis de nosso sistema jurídico, de forma teleológica, objetivando a melhor solução para aquele conflito ambiental.
Neste contexto, dependendo dos interesses discutidos, deve ser observado o que prevê nossa legislação acerca da legitimidade e interesse jurídico para ser “parte” neste processo, inclusive para preservação de eventuais direitos indisponíveis, concluindo, assim, não haver dúvida acerca da possibilidade de ser recorrer a tais métodos alternativos de soluções de conflitos em matéria ambiental relacionada a questões patrimoniais e disponíveis dos seus interessados.
Por exemplo, em se tratando de direitos difusos relacionados com algum conflito envolvendo uso da água, abastecimento, o Ministério Público tem quer ser parte necessariamente desta solução. Já na hipótese de direitos coletivos, em que uma associação de bairro pleiteia a conservação de um parque em razão de obras de construção civil em determinada localidade, os representantes legais desta associação precisam ser chamados para ser parte de uma mediação. Já no caso de direitos individuais homogêneos, podemos pensar na fase de liquidação de uma sentença judicial de uma indenização decorrente de um acidente ambiental que gerou danos à saúde de várias pessoas, resolvida mediante uma mediação ou conciliação entre as partes interessadas.
Há registros de diversos cases ambientais internacionais resolvidos, outros evitados, mediante o uso da arbitragem, da mediação e da negociação, como o da Mineradora BHP em Tintaya, no Peru, onde a mediação auxiliou a empresa no diálogo com os povos indígenas locais quanto à sua realocação da terra de seus ancestrais para dar lugar à mineração, além de minorar os impactos ambientais locais; aqui no Brasil, o projeto Minas-Rio, da mineradora inglesa Anglo American, que visa a exploração do minério de ferro, contou com técnicas de negociação para auxiliar na aquisição das terras necessárias para a passagem do gasoduto; nos Estados Unidos da América, o uso do rio Hudson para produção de energia; a disputa sobre a extensão da Interestadual 90 através do Lago Washington e em Seattle, e por onde ela seria construída; a disputa entre um desenvolvedor hidrelétrico de pequena escala, que queria extrair a água do lago em Swanville, Me. e a cidade de Swanville, que queria usar a água para outros fins; a cidade de Eau Claire, Wisconsin, estava envolvida em uma disputa com a cidade de Seymour, que Eau Claire havia escolhido como lixão; moradores de Port Townsend, Washington, solucionaram mediante um acordo sobre o novo local para a instalação de um terminal de balsas [1].
Considerando a finalidade e os princípios que regem a tutela do direito ambiental, podemos pensar que não somente direitos patrimoniais relacionados ao aspecto indenizatório decorrente de um problema ambiental podem ser resolvidos pelos Mascs.
Se imaginarmos uma situação anterior ao conflito ambiental, em que as partes interessadas possam ser previamente consultadas, audiências públicas realizadas, conversas entre os envolvidos, cada qual expondo seus interesses e preocupações acerca das vantagens e desvantagens das pretendidas intervenções que possam vir a gerar um impacto ou dano ambiental, seria possível e viável esta fase ser conduzida previamente por uma destas ferramentas de solução de conflitos, pois o resultado esperado de “ganha-ganha” atingiria seu potencial pleno, em que todos sairiam vitoriosos; mas o mais importante é que estaríamos, conscientemente, diminuindo o impacto ao ambiente de uma forma programada, sustentável e preservada para as futuras gerações.
Precisamos conferir aos Mascs a relevância necessária para que as soluções alcançadas por meio deles sejam definitivas, ou seja, sejam respeitadas por todos, principalmente pelos órgãos e instituições públicas, além do Poder Judiciário, pois somente assim a credibilidade que deles se espera será efetiva, além de ampliar sua utilização em larga escala nos mais diversos segmentos, o que certamente contribuirá para o desentrave da burocratização, fomentando mais investimentos e desenvolvimento econômico para nossa sociedade.
Diante do exposto, é possível concluir que os métodos alternativos de solução de conflitos em matéria ambiental apresentam vantagens em relação ao processo judicial, especialmente em termos de rapidez e efetividade na preservação do meio ambiente. A utilização desses métodos pode contribuir para o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental, ao permitir que as partes cheguem a uma solução consensual, criativa e mais sustentável e protetiva para o conflito ambiental, trazendo, inclusive, para o processo todos os participantes e interessados, tais como, acionistas, stakeholders, comunidade local etc., o que faz com que o compromisso assumido vincule todos aos interesses ali discutidos. Além disso, trata-se de um ramo ainda inexplorado em nosso sistema jurídico, que, certamente, avançará cada vez mais, razão pela qual precisamos nos adequar a ele e preparar o “ambiente jurídico” e os novos profissionais para desenvolver as habilidades e as competências necessárias para utilizá-los.
[1] Settling Things — Six Case Studies in Environmental Mediation, matéria retirada do site do U.S. Department of Justice, Office of Justice Programs, https://www.ojp.gov/ncjrs/virtual-library/abstracts/settling-things-six-case-studies-environmental-mediation.
Por Juána Juliana Diniz Kashtan, advogada, mestre em Direito das Relações Sociais, sub-área Direitos Difusos e Coletivos, pela PUC-SP, e especialista em Direito Constitucional Ambiental pela ESDC, além de mediadora e conciliadora pela ESA/OAB-SP.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 16 de abril de 2023, 7h07
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Métodos Alternativos de Resolução de Conflito

Resumo:
No presente estudo fez-se uma análise concisa e objetiva das metodologias para resolução alternativa de conflitos. Citou-se a forma judicial, que frequentemente mostra-se mais letárgica e custosa, a despeito de sua credibilidade junto à população; apontou-se a instituição dos Juizados Especiais como bem-vindo mecanismo de simplificação, modernização efetivação do direito de acesso à Justiça; mencionou-se a alternativa paraestatal e que, não raro, acabam por ser ilegais, expondo de forma negativa as partes envolvidas; abordamos, por fim, as metodologias atuais mais aceitas e adequadas para solução alternativa de conflitos, tais como a conciliação, a mediação e a arbitragem que, a despeito de ainda estarem em período relativamente inicial e até embrionário de aplicabilidade em nosso País, mostram-se como maneiras bastante viáveis para a necessária resolução de conflitos, inclusive em âmbito internacional. Evidenciou-se as principais vantagens de tais métodos, tais como economia de tempo e recursos financeiros, o ganho quanto evolução social onde as partes contribuem diretamente com a solução do próprio litígio, o peculiar sigilo em relação aos temas abordados no litígio e os elementos trazidos à análise. Por fim, conclui-se que a despeito da ainda relativamente baixa permeabilidade social, estes últimos métodos têm verdadeiro impacto superlativos, se adotadas de formas mais efetivas e estratégicas, para desafogar o Poder Judiciário de um sem número de demandas.
Palavras-chave: Conciliação. Mediação. Arbitragem. Poder Judiciário. Métodos Alternativos. Solução de conflitos.
Abstract:
In this present study, a concise and objective analysis of the methodologies for alternative conflict resolution was carried out. The judicial form was mentioned, which often proves to be more lethargic and costly, despite its credibility with the population; the institution of Special Courts was pointed out as a welcome mechanism for simplification, modernization and a way of effectiveness of the right of access to Justice; the parastatal alternative was mentioned as being frequently illegal, negatively exposing the parties involved; Finally, we approach at the most accepted and appropriate current methodologies for alternative conflict resolution, such as conciliation, mediation and arbitration, which, despite still being in a relatively early and even embryonic stage of applicability in our country, show themselves as being a quite viable way for the necessary resolution of conflicts, even under international perspecrive. The main advantages of such methods were evidenced, such as a time and financial resources saver, the gain in terms of social evolution where the parties contribute directly to the solution of the dispute itself, the peculiar secrecy in relation to the topics addressed in the dispute and the elements brought to the analysis. Finally, it is concluded that despite the still relatively low social permeability, these last methods could have a real superlative impact, if adopted in more effective and strategic ways, as a relief to the Judiciary with its countless number of demands.
Keywords: Conciliation. Mediation. Arbitration. Judiciary Branch. Alternative Methods. Conflict resolution.
1 Introdução
A sociedade é um corpo dinâmico e com uma infinidade de nuances que permeiam os mais diversos extratos sociais que a compõem.
Diante desta realidade, é inocente e até pudico acreditar que apenas uma forma de solução de conflitos possa, de fato, estar apta a resolver, da maneira mais adequada, todo esse matiz de relações sociais.
A partir dessa constatação, e justamente em razão da dinamicidade das relações sociais, é que passam a surgir alternativas para a busca da solução de conflitos. Tais métodos permeiam, desde o mais denso e complexo procedimento judicial, passando por sistemas mais simplificados e objetivos adotados pelos Juizados Especiais, tangenciando, meios extrajudiciais de solução de disputas (conciliação, mediação e arbitragem) e constatando-se, por último, alternativas paralelas (e não raro ilegais) para uma imposição de resolução ao conflito posto.
Tomando esta realidade como pano de fundo, o presente estudo teve como metodologia a pesquisa doutrinária e bibliográfica sobre a realidade cotidiana do Judiciário brasileiro, com análise de dados estatísticos fornecidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre as formas, riscos e benefícios, além do impacto destas formas alternativas de resolução de conflitos, tanto para a sociedade quanto para o próprio Poder Judiciário.
A realização do mesmo justifica-se por conta da relevância dos temas e métodos abordados e que, a despeito de suas evidentes vantagens, ainda tem uma capilaridade bastante restrita na sociedade brasileira atual, devendo ser dadas a conhecer e ter sua utilização estimulada sempre que possível.
2 Dos Métodos
No que tange às mencionadas alternativas paralelas e eventualmente ilegais de solução de conflito, estas costumam surgir em ambientes onde o Estado, com sua estrutura legal e jurídica lhana, não permeia satisfatoriamente os indivíduos ou deles não possui credibilidade.
Estas situações de fato são frequentemente constatadas em comunidades mais carentes ou não abarcadas pelo aparelho estatal, onde a população se socorre de lideres locais para a busca de uma espécie de jurisdictio2 paraestatal como mecanismo para a solução de sua contenda.
Por ser uma forma não legalmente reconhecida como mecanismo legal para solução de litígios, não abordaremos esta forma específica de maneira mais detida, cabendo-nos mencionar sua existência eis que, de fato, vem sendo há tempos utilizadas por parte da população brasileira.
Como já observou a doutrina, há de se ter nos membros da sociedade uma sensação de pertencimento para que os eventuais jurisdicionados adiram a um determinado método de solução de conflito e, neste particular, cabe ao Estado propiciar as condições para que isso ocorra (BACELLAR, 2012). Quando este mostra-se ausente, deixa espaço para o florescimento de alternativas nem sempre adequadas ou justas para a resolução de conflitos.
A título exemplificativo imagine-se uma família que resida em um barraco, construído em terreno invadido, como em uma favela. Este núcleo social, sujeito de direito por excelência, acaso precise solucionar um problema, sentindo-se “excluído” e distante do aparato estatal, acaba por buscar dentre os lideres desta mesma comunidade, quem possa fazer as vezes de juiz e, não raro, acabam por se sujeitar à constrangimentos, violência, medo e ameaças para sobreviver em um ambiente que se obrigou ou precisou se inserir e acabou por ser acolhido.
A despeito de sua efetiva e constatável existência, por se tratar de situação à margem do Estado Democrático de Direito, apenas sinalizamos a sua ocorrência sem, contudo, aprofundar-nos em seu estudo.
No outro extremo do espectro de possíveis maneiras de solução de conflitos, temos o método dito judicial.
Neste caso, estamos falando do Poder Judiciário que, como reflexo do Estado Democrático do Direito, impõe suas normas, métodos e procedimentos para dar a quem o procura, a solução ou jurisdição ao problema apresentado.
Nesta plataforma estatal já avançamos muito no quesito acesso, quando adotamos, por exemplo, uma postura mais simplificada à questões de menor complexidade com os Juizados Especiais.
A lei 9099/95 trouxe consigo uma estrutura principiológica que tem como objetivo a facilitação da busca judicial para a solução, por meio do Estado, para o conflito que se apresenta. Foram albergadas nesta legislação causas menos complexas e de valor inferior ao da Justiça Comum e, a par disso, autorizou que o cidadão, sponte sua, sem a necessidade de intermediários (advogados, procuradores, et cetera), apresente seus fatos e argumentos para, através disso, consiga que lhe seja dito seu direito.
Não foi diferente a alavancagem da acessibilidade quando da instituição dos benefícios da Justiça Gratuita que, tal e qual a lei dos Juizados Especiais, trouxe à população menos abastada, um empoderamento muito maior do que antes, autorizando que buscasse o Estado Juiz para a solução do conflito posto, sem que, para tanto, fosse obrigada a dispor de dinheiro para ter o efetivo acesso à Justiça (v.g. pagamento de custas processuais).
Neste particular, inclusive, há de se ter em mente que em momento anterior à instituição dos benefícios da justiça gratuita e dos próprios Juizados Especiais, uma parcela considerável de cidadãos brasileiros ficava à margem da sociedade quanto ao acesso e efetivo direito de busca da Justiça.
Porém, ambas as situações, a despeito de expandirem e facilitarem tal acesso, ainda se mostram insuficientes e falta ao próprio Estado o efetivo cumprimento de leis e medidas que deveria observar.
Neste particular mencionamos valores como celeridade, transparência, imparcialidade, probidade e efetividade que embora constem da legislação, na prática, em diversos casos, distanciam-se do objetivismo e justeza legal desejada pelo legislador e partem para um emaranhado nebuloso e pernicioso que acaba por desacreditar a própria Justiça.
Por fim, temos visto ganhar força três pilares que, em nosso sentir, tem o condão de atender os valores supramencionados e, ao mesmo tempo, desafogar o Poder Judiciário dando, ao jurisdicionado, o poder de resolver seus próprios conflitos.
Tratam-se da Mediação, da Conciliação e da Arbitragem que, a despeito de serem métodos alternativos de solução de conflitos, possuem sutilezas e características que as diferenciam entre si.
2.1. Mediação, Conciliação e Arbitragem
Parafraseando Aristóteles “in médium virtus”3 e, partindo desse axioma, abordamos de forma mais detidas os métodos que, no nosso sentir, tem o potencial mais supino para impactar de forma positiva a população, trazendo um amadurecimento enquanto sociedade e tendo, como reflexo, o desafogamento do Poder Judiciário.
No relatório Justiça em Números do CNJ (Conselho Nacional de Justiça)4 temos a indicação de que, para cada grupo de 100.000 habitantes, 10.675 ingressaram com uma ação junto ao Poder Judiciário no ano de 2020 5. Projetando tais números para a população do Brasil em 2022 6, temos que o Judiciário receberá cerca de 22.9 milhões de novas ações.
Os números são superlativos e, como mostram os gráficos abaixo, a despeito da tendência de baixa entre os anos de 2019 e 2020 (muito em razão da pandemia), há um histórico de casos pendentes de cerca de 69.1 milhões de processos 7.
O mesmo relatório aponta como gargalos a produtividade dos processos nas fases de conhecimento e execução e cujos números levam-nos à uma inescapável conclusão. O volume de ações iniciadas é muito superior àquelas encerradas pelo Poder Judiciário e este represamento reflete numa imagem de morosidade e ineficiência deste mesmo Poder.
Enquanto o número de litígios aumenta, o número de situações solucionadas não acompanha tal crescimento e a partir destes dados, impõe-se a busca por formas mais adequadas para a solução dessa enxurrada de demandas.
Neste plano apresentam-se a Conciliação, a Mediação e a Arbitragem que, a despeito de serem institutos semelhantes em sua origem (forma alternativa de solução de conflitos) possuem nuances que merecem destaques quanto aos seus riscos, benefícios e efetivos reflexos no Poder Judiciário.
A Mediação tem seu conceito dado pela lei 13.140/15 que diz se tratar de técnica de negociação na qual um terceiro imparcial e sem poder decisório é indicado ou aceito pelas partes e as auxilia a encontrar uma solução que atenda ambos os lados.
Veja-se que na Mediação o terceiro imparcial não tem poder decisório e, na prática, o mediador torna-se uma espécie de conselheiro que auxilia o diálogo entre as partes sem, contudo, poder sugerir ou impor termos e condições para a celebração de eventual acordo, cabendo àquelas realiza-lo.
A Conciliação é um método muito similar, porém, conforme dispõe o art. 165 do Código de Processo Civil, o conciliador atuará preferencialmente em casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, podendo sugerir soluções para o litígio sendo, entretanto, proibida a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. Neste particular há de se mencionar os CEJUSCS (Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania).
Mediação e Conciliação, em que pese tratadas como sinônimos, apresentam uma sutil diferença onde a técnica usada na conciliação visa, sobretudo, aproximar as partes de forma mais direta, havendo uma efetiva participação do conciliador na construção da solução do conflito. Por seu turno, o mediador interfere menos na solução, atuando de forma mais detida na aproximação das partes.
Ambas as formas alternativas de solução de conflitos podem ser realizadas tanto no âmbito judicial quanto no extrajudicial, orientando-se sempre pelos princípios da imparcialidade, isonomia, oralidade, informalidade, autonomia da vontade das partes, busca pelo consenso, confidencialidade e boa-fé.
De acordo com MORAES (1999), o processo da mediação é, muitas vezes, desenvolvido quando as partes, além do interesse que buscam ter respeitado, apresentam-se em um estado sentimental conturbado sendo dever do mediador trabalhar para amenizar estas rusgas e as suas respectivas consequências.
Neste método de resolução de conflitos percebemos uma grande economia financeira e de tempo, tendo a oralidade como regra para a apresentação dos pontos sobre os quais há dissenso. Como resultado prático temos uma reaproximação das partes, grande autonomia das decisões e o equilíbrio na relação estre ambas.
Na conciliação temos igualmente um terceiro imparcial, mas, neste caso, este terceiro pode sugerir termos ou condições para que as partes, após eventuais concessões mútuas, encontrem a solução mais adequada para o caso posto em análise.
Neste método, tal e qual a mediação, constata-se também a economia financeira e de tempo; a oralidade pode prevalecer, mas não é incomum a exposição dos fatos de maneira escrita. Por fim, verifica-se a impossibilidade de o conciliador impor qualquer espécie de decisão terminativa eis que, como a própria nomenclatura sugere, trata-se de um acordo, com concessões havidas entre os envolvidos, com escopo final em solucionar a contenda com a adesão dos contendores.
Por derradeiro temos a arbitragem. Esta é um meio privado de solução de conflitos, relativos à direitos patrimoniais disponíveis, onde as partes selecionam um ou mais especialistas na matéria objeto da controvérsia e este, após análise e eventual produção de provas e oitiva dos envolvidos, decidem a controvérsia de forma definitiva.
Na arbitragem há uma espécie de transferência da decisão para este(s) terceiro(s) imparcial(ais) e ela tem origem na chamada cláusula arbitral onde além da participação, os envolvidos optam de forma definitiva por abrir mão do Poder Judiciário, mesmo diante de uma sentença arbitral não favorável.
Uma particularidade quanto à arbitragem é que, embora se assemelhe mais com o exercício da jurisdição pelo Poder Judiciário sendo, portanto, adversarial, da decisão exarada pelo árbitro, não é cabível qualquer tipo de recurso sem, contudo, afrontar o disposto no artigo 5º. XXXIV, a e XXXV da Constituição Federal.
Como característica comum aos três métodos supracitados, temos a inexistência de elementos preestabelecidos ou forma procedimental, podendo variar de acordo com o contrato entre as partes, a instituição responsável pela tentativa de composição ou pela decisão, e mesmo a matéria de que trata a controvérsia.
3 Benefícios e Impactos no Judiciário
Em vista do analisado, temos que os benefícios apresentados pelas três formas alternativas de conflitos são superlativos.
O ganho de tempo, a economia de dinheiro, o empoderamento das partes na busca ativa pela solução dos seus próprios problemas, acaba por refletir de forma mais positiva na tão almejada paz social; sobretudo porque a construção da solução partiu dos próprios contendores.
A oralidade, o equilíbrio da relação e a própria reaproximação das partes, são fortes elementos que, em última análise, quando estimulados, acabam por trazer uma evolução social como um todo onde, ao invés de buscar resolver as diferenças por meio de litígio e imposição de uma solução, os envolvidos a constroem, sponte sua.
Por fim, dentre os benefícios, chamamos a atenção para a confidencialidade e o sigilo estipulado na arbitragem.
Esta é uma das grandes pedras de toque na utilização da arbitragem como forma de solução de litígio.
Imagine-se uma disputa envolvendo uma empresa como a Coca-Cola e um dos seus fornecedores de matéria prima. Numa demanda judicial, pública por excelência, a discussão da fórmula da Coca-Cola e as espécies e quantidades de insumos que utiliza poderia pôr em grande risco segredos industriais seculares e expor aos seus concorrentes informações cruciais para o sucesso do seu negócio.
Num conflito desta espécie, ao optarem pela Arbitragem, as partes poderiam estipular cláusula de confidencialidade e sigilo, de modo que a discussão e a solução havida no procedimento, acaba por dizer respeito exclusivamente aos envolvidos, evitando-se assim qualquer tipo de publicidade e riscos às partes envolvidas.
Tal privacidade, de capital relevância no mundo negocial e empresarial, não é tida, em princípio, como relevante no Poder Judiciário e, na prática, sobretudo neste ambiente mercadológico, pode ser peça fundamental para viabilizar a busca da solução de um conflito.
Nesta toada, e pelos diversos pontos sinalizados neste estudo, percebe-se um impacto considerável no Poder Judiciário, sobretudo na redução de demandas e de todo o aparato necessário para resolver as mesmas.
Veja-se neste sentido que o próprio CNJ (Conselho Nacional de Justiça), indicou em seu relatório de 2021 que houve, no âmbito do Poder Judiciário, um índice de até 20,6% de conciliações em processos de conhecimento, e de até 6,2% nos processos em fase de execução nos últimos anos.
Se transportarmos estes percentuais ao volume de novos processos esperados para 2022 (22.9 milhões de novas ações), temos uma considerável redução de mais de 4.72 milhões de processos.
A depender da divulgação e do estímulo à estas formas alternativas de solução de conflitos, os números poderão ser até superiores, mas, o volume já apontado implica em incomensurável economia de tempo, dinheiro e pessoal, que acabam podendo ser realocados para o acompanhamento daquelas demandas que efetivamente exigem a intervenção estatal por meio do Poder Judiciário.
As vantagens e os benefícios, em nosso sentir, são expressivos e devem ser considerados como efetiva via de escape para a supostamente insanável letargia judicial.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho objetivou contribuir para o desenvolvimento do conhecimento e ampliação do alcance dos métodos alternativos de solução de conflitos.
Vivemos em uma sociedade que, dadas as maneiras até então existentes, acabava por se tornar eminentemente litigiosa, buscando de forma quase que exclusiva o Poder Judiciário para a solução de seus litígios.
O gradual surgimento de alternativas solucionar os litígios existentes, além de estimular uma evolução social com a atuação positiva dos envolvidos na busca da solução do problema, acaba por impactar de forma ainda mais positiva no Poder Judiciário, já abarrotado de processos e cujos números demonstram um maior número de ações iniciadas do que finalizadas.
Essa desjudicialização acaba por indicar um amadurecimento social como um todo, além de, como já dito, refletir de forma positiva na redução de demandas longas e burocráticas postas à julgamento sem, entretanto, ofender o princípio da inafastabilidade e do acesso ao Poder Judiciário.
Neste âmbito, a conciliação, a mediação e a própria arbitragem vêm, com seus métodos característicos, como ferramentas do Estado e da própria população (sem depender daquele) em busca de resolutividade do problema e não de litigiosidade para a mesma finalidade, trazendo verdadeira luz no fim do túnel em favor de todos os envolvidos.
Finalizada a revisão bibliográfica, conclui-se que se tornou possível uma melhor compreensão das principais variáveis de cada uma das alternativas mencionadas, bem como verificar e entender em que pontos e de quais formas cada uma destas ferramentas pode auxiliar os envolvidos e a população como um todo em vista da efetiva solução dos seus impasses.
5 Referências
BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e Arbitragem. São Paulo. Saraiva, 2012 – Coleção Saberes do Direito; 53.
CNJ. Relatório Justiça em Números – 2021. [Ebook]. https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2021/09/relatorio-justica-em-numeros2021-12.pdf . Acessado em 20/04/2022.
GUILHERME, Luiz Fernando do Vale de Almeida. Manual de Arbitragem – doutrina – legislação – jurisprudência. Editora Método. 2ª. Ed. 2007.
IBGE | Projeção da população – https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/index.html.
KAMINSKI, Omar (organizador). Internet Legal: o direito na tecnologia da informação. Curitiba. Juruá, 2003.
KAMEL, Antonie Youssef. Mediação e Arbitragem. Curitiba. Intersaberes, 2017
LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001.
MORAES, José Luis Bolzan de. Mediação e Arbitragem: alternativas à Jurisdição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

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2. Dizer o direito (tradução livre)︎
3. A virtude está no meio. (tradução livre)︎
4. https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2021/09/relatorio-justica-em-numeros2021-12.pdf︎
5. Relatório Justiça em Números – 2021 – fls. 112 – Figura 61︎
6. https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/index.html – 214.508.000 habitantes – acessado em 22/04/2022 – 10:18h︎
7. Relatório Justiça em Números – 2021 – fls. 171 – Figura 114︎
Por Eduardo Faria de Oliveira Campos, advogado. Mestrando em Estudos Jurídicos com Ênfase no Direito Internacional pela Must University, Especialista em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Especialista em Direito Processual Civil e Direito Civil pela Universidade Estadual de Londrina, Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Estadual de Londrina.
Fonte: Jus, 16/02/2023 às 11:20
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Prevenção e gestão de conflitos nas empresas

Empresas não negociam, não gerem os próprios negócios. Somos nós, as pessoas que pertencem às empresas que negociamos, interagimos e inovamos. Parece óbvio, mas é preciso reforçar que o gestor é uma pessoa, e como tal, lida diariamente com outras pessoas, que lidam diariamente com outras pessoas nas convivências pessoais e profissionais.
É preciso desenvolver o olhar para a pessoa humana, não mais com uma visão de “ser racional”. É um ser racional, emocional e interrelacional. O que isso quer dizer? Ser humano, que tem uma compreensão de si mesmo, sentimentos, pensamentos e comportamentos, que interage com o outro, dentro de um sistema complexo de relações.
As empresas estão reconhecendo que as pessoas são seus maiores ativos: ativos intangíveis que propiciam atingir ativos tangíveis. Neste caminho, é fundamental compreender como pensamos, sentimos e agimos diante das adversidades nos relacionamentos, e como essa interação impacta em resultados numéricos, na produtividade, nas atividades cotidianas.
Ao gerenciar pessoas é preciso gerir conflitos. Gerir conflitos envolve um leque de ações que têm origem a partir do diálogo e da construção do consenso. É a partir de uma comunicação sustentável nas relações, em que as trocas entre os indivíduos acontecem com equilíbrio e transformação positiva.
Os conflitos nas empresas
Um problema muito relatado nas organizações é pertinente a relacionamentos, confrontos, desentendimentos, discordâncias, fofocas, mensagens mal compreendidas, gerando improdutividade e, muitas vezes, rompimentos nas relações. Essas situações revelam a dificuldade em lidar com o outro no ambiente de trabalho, configurando-se numa das maiores causas dos conflitos no mundo corporativo.
O conflito é algo que faz parte das relações humanas. Nas interações cotidianas, vivenciamos controvérsias em vários ambientes, principalmente no local de trabalho em que convivemos a maior parte do dia. Algumas controvérsias parecem imperceptíveis, mero ruídos de comunicação, mesmo assim, estão presentes e impactam individual e coletivamente.
Dentro das organizações, os conflitos geram custos, muitas vezes invisíveis e de difícil mensuração (Burbridge, 2012). São fatores que ocasionam graves danos ao nosso desempenho e ao funcionamento do negócio a longo prazo.
As disputas e controvérsias possuem muitos efeitos estressantes, impactando na produtividade, nos resultados, no trabalho em equipe, na comunicação entre os vários públicos com os quais a empresa interage (stakeholders), no desempenho em projetos e metas.
Quando não administrados, os conflitos vão se acumulando a ponto de escalonar e ocasionar situações problemáticas como: desmotivação, boicotes e vinganças, fofocas, operação tartaruga, resistência a mudanças, trabalhos mal executados, falhas de comunicação, erros não admitidos, omissões, insatisfações, grande rotatividade, e, até mesmo, causa de adoecimentos e afastamentos (como o burnout), acidentes laborais e número excessivo de reclamações trabalhistas (processos judiciais).
Todos esses fatores repercutem consideravelmente na relação com clientes, consumidores, parceiros, terceirizados e fornecedores, por ocasionar atrasos em entregas de produtos, serviços incompletos, insatisfação no atendimento. O resultado é um cenário problemático, gerando danos de grandes proporções, diante da desconexão entre as pessoas que formam toda a equipe da empresa.
No entanto, é possível reverter esta situação problemática, ao transformar positivamente a forma de interação entre as pessoas, através da comunicação e de técnicas de prevenção e gestão de conflitos, com respeito e incentivo à colaboração.
Em um ambiente de diálogo, os líderes e colaboradores lidam de forma positiva com controvérsias e adversidades, viabilizando soluções criativas e oportunidades de mudanças que promovam melhores resultados.
Aprender a lidar positivamente com conflitos é a chave para promover a transformação nos relacionamentos, o desenvolvimento de pessoas e equipes e, consequentemente, o crescimento sustentável da organização, diante da longevidade dos relacionamentos.
A partir da aquisição das competências, ferramentas e habilidades essenciais líderes e equipes estarão preparados para virar a chave nos conflitos.
Dentre os benefícios para as empresas que podemos listar são: a melhoria do engajamento, a harmonia das equipes, reduzindo índices de turnover e absenteísmo e, principalmente, o fortalecimento da cultura organizacional.
A gestão positiva de conflitos colabora na longevidade dos relacionamentos, com a melhoria da comunicação, normaliza os conflitos que porventura surgem dos desafios cotidianos dentro das empresas e propicia a capacitação para as equipes superarem estes obstáculos com aprendizados. A convivência dentro da organização passa a ser mais saudável e produtiva.
Evitar ou prevenir conflitos?
Prevenir não é o mesmo que evitar! Abrange criar estratégias e atitudes para identificar possíveis controvérsias e ruídos, de forma a criar soluções.
A prevenção dos conflitos começa pela mudança de mentalidade.
Conflitos! O que passa em nossa mente quando ouvimos a palavra conflito? Quais sensações sentimos ao pensar a respeito de um conflito pessoal que possamos ter vivido ou estamos vivenciando? Que sentimentos surgem? Quais atitudes temos diante desta situação?
O primeiro passo para administrar essas adversidades nos relacionamentos é compreender o que pensamos, sentimos e como nos comportamos diante dos conflitos.
A percepção de mundo que temos impacta em nossas ações.
A grande maioria de nós não reflete muito sobre como os conflitos impactam em nossas vidas, nesta perspectiva: pensamentos, sensações (físicas), sentimentos e comportamentos.
Simplesmente, vivenciamos todos os dias situações de controvérsia, em maior ou menor grau, e agimos instintivamente, ou evitando ou reagindo a estes estímulos.
É importante compreendermos que o que pensamos a respeito dos conflitos determina nossos comportamentos, passando pelas sensações e sentimentos. Assim, a construção do significado que damos à palavra é determinante em nossas escolhas de como lidar com essas adversidades cotidianas.
Muitos atribuem a palavra conflito como sendo embates, combates, guerras, violências físicas e agressões.
O conceito pode ser ampliado para ruídos de comunicação, controvérsias, pontos de vista diferentes.
E se entendermos o conceito nesta perspectiva mais ampla, percebemos que o conflito é inato ao ser humano e, todos os dias, vivenciamos situações controvertidas, incompatibilidades, diálogos interrompidos, tensões na comunicação, brigas e discussões, que provocam desde situações desagradáveis a resultados desastrosos.
Percebidos assim em seus efeitos, neste viés negativo, conflitos nos causam mal-estar, desconforto, cansaço, estresse e várias sensações ruins, porque associamos a uma experiência difícil e problemática.
Acabam promovendo em nós emoções e sentimentos como frustração, tristeza, nojo, raiva, impotência. Esta é a tempestade perfeita para desenrolar duas reações: ou luta (ataque, reação agressiva) ou fuga (paralisia, subordinação).
Para muitas pessoas, a atitude é evitar o conflito, “engolindo sapo”, escolhendo se manter distante da pessoa ou situação, e “varrer para debaixo do tapete”, acreditando que “o tempo cura tudo”. Todas essas citações em aspas trazem crenças limitantes em relação aos conflitos, muito embasada em maneiras passivas de lidar com desafios.
Muitos gestores não percebem ou fingem que não há problemas interpessoais em suas equipes.
Um dos motivos é porque entendem que essas diferenças pessoais devem ser resolvidas fora do ambiente laboral, mantendo foco única e exclusivamente nas tarefas.
A longo prazo, o problema pode tomar dimensões mais complexas com a atitude omissa do gestor e gerar um verdadeiro embate no local de trabalho ou distanciamento com rompimento total de uma relação, prejudicando as atividades, compromissos e prazos da organização.
Outras pessoas decidem “não levar desaforo para casa”, com reações mais intensas e por vezes desproporcionais aos gatilhos iniciais. Nestas situações, perdem rapidamente o equilíbrio e passam a atacar o suposto “oponente” de maneira desproporcional, “perdendo a razão”, interpretando o outro como um verdadeiro inimigo. Ao recobrar a normalidade, percebe os exageros, sentindo remorso, culpa, vergonha, e os rompantes podem gerar também rompimentos numa relação, ou outras sérias consequências.
Nesta outra polaridade, o clima de reatividade gera insegurança nas relações, inclusive propicia a caracterização de contextos de assédio moral no trabalho.
Um ambiente de muita conflituosidade vem sendo considerado tóxico, e desestimula a criatividade e autonomia dos colaboradores, além de ser fator inclusive de litígios judiciais.
Em um contexto de complexidade das relações humanas, é fundamental desenvolver habilidades e técnicas para lidar com os relacionamentos humanos de forma positiva.
Prevenir significa criar recursos e estratégias para melhor lidar com essa complexidade humana.
A chave para a mudança é compreender que o conflito é uma circunstância neutra, a depender de como escolhemos lidar com ele. Tudo é um processo de escolha: como escolhemos perceber a situação.
O conflito manifesta um sintoma de algo que não está funcionando bem numa relação, apontando muitas vezes uma necessidade não atendida, diferenças entre pontos de vista, interesses aparentemente antagônicos, a partir de uma diversidade de repertórios de vida.
John Paul Lederach (Lederach, 2012), reconhecido internacionalmente como pacificador, possui uma obra em que nos convida a ver o conflito como “uma oportunidade, um dom”. Sustenta que:
(…) ao invés de ver o conflito como ameaça, devemos entendê-lo como uma oportunidade para crescer e aumentar a compreensão sobre nós mesmos, os outros e nossa estrutura social. Os conflitos nos relacionamentos de todos os níveis são o modo que a vida encontrou para nos ajudar a parar, avaliar e prestar atenção. Uma forma de conhecer verdadeiramente nossa condição humana é reconhecer o dom que os conflitos representam em nossa vida. Sem ele a vida apresentaria uma topografia monótona e plana marcada pela mesmice, e os relacionamentos seriam muito superficiais.
O conflito também gera vida: através do conflito nós reagimos, inovamos e mudamos. O conflito pode ser entendido como o motor de mudança, como aquilo que mantém os relacionamentos e as estruturas sociais honestas, vivas e dinamicamente sensíveis às necessidades, aspirações e ao crescimento do ser humano.
Se percebido positivamente, o conflito é oportunidade de mudanças necessárias para retomada da energia e sintonia do relacionamento, ou mesmo transformação desta relação, para gerar maior engajamento e criatividade, sem a necessidade de romper abruptamente a comunicação. Inclusive, pode promover soluções inovadoras e mais adequadas a lidar com o problema.
As crises são momentos de aprendizado e potencial desenvolvimento dos envolvidos.
A partir da mudança de percepção e da construção de significado do conflito, é possível promover um convite ao diálogo autêntico, em que há espaço para uma escuta dos diferentes pontos de vista.
Saber lidar com controvérsias nos promove protagonismo por meio da autodeterminação e autonomia de vontade. Isso acontece quando compreendemos alguns aspectos internos importantes: a percepção ampla da situação conflituosa, identificação de necessidades e interesses, acolhimento de emoções e sentimentos e assertividade.
É um processo gradativo de aprendizagem (humana), em que saímos da total inconsciência e incapacidade, para a consciência acerca dessas adversidades e vamos, por meio de treinamento em novos hábitos, criando as competências e os recursos necessários (capacidades) para superar os desafios nas relações.
Ao mesmo tempo, compreendemos quais conflitos não poderão ser prevenidos, e sim administrados, para escolhermos o meio mais adequado para gerir essas controvérsias (negociação, mediação, conciliação, por exemplo).
O que é gestão de conflitos nas organizações?
A gestão de conflitos envolve práticas de escuta ativa e diálogo das necessidades e interesses que estejam em dissonância, buscando soluções que atendam adequadamente os indivíduos, gerando satisfação e eficiência na transformação das relações.
Esta atividade tem por objetivo prevenir o escalonamento de controvérsias, administrar positivamente as situações conflituosas que existem, além de promover mudanças positivas a partir de soluções criativas e adequadas a cada contexto. Caso já esteja instaurada a discordância, há técnicas e meios de administrar adequadamente cada situação para gerar o consenso e a solução.
Com estas boas práticas de gestão de conflitos, há melhoria da comunicação interna e do clima organizacional, criando um ambiente colaborativo.
A empresa pode desenhar um processo organizado de administração e tratamento dos conflitos da forma mais adequada a cada situação, levando em consideração os níveis de complexidade dos conflitos.
Existem procedimentos que estruturam internamente uma gestão das controvérsias para fomentar o diálogo estratégico.
Em um nível menos complexo, inicia-se com treinamentos em competências e técnicas que envolvam o diálogo e ferramentas de autogestão de conflitos, contemplando líderes e gestores, e, ainda, todos os colaboradores. Nesta etapa, o objetivo é a melhoria da comunicação, incentivando a manifestação da singularidade de cada pessoa que compõe a organização, com sentido, autonomia e autorresponsabilidade.
Pretende-se trabalhar o pertencimento de cada indivíduo neste coletivo, por meio da escuta de todos os envolvidos na tomada de decisão, para o direcionamento das ações cotidianas da empresa. Dessa forma, há o incentivo para que contribuam nos processos produtivos com autonomia, motivação e engajamento.
Em casos de maior complexidade da disputa, a mediação é o meio adequado a lidar com adversidades no ambiente corporativo, proporcionando relações mais duráveis e confiáveis ao longo do tempo.
A mediação é uma forma de resolver conflitos com a intervenção de um terceiro neutro, ou seja, uma pessoa que não conheça previamente os envolvidos e possa manter certo distanciamento para auxiliá-los a retomar o diálogo.
A depender da estrutura da empresa, o mediador pode ser um colaborador interno, ligado aos Recursos Humanos, ou um mediador externo, por intermédio de uma consultoria especializada. Há possibilidades do gestor atuar como mediador, a partir de sua capacitação, em circunstâncias em que não possua envolvimento com o conflito.
Vários modelos podem ser estruturados conforme a necessidade da empresa, sempre pautando a gestão de conflitos nos princípios do diálogo e do protagonismo das pessoas envolvidas.
Quando existe um ambiente com comunicação aberta dentro das organizações, cria-se uma cultura de confiança, em que todos podem colaborar e cooperar na direção de um sentido maior.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Burbridge, A. e. (2012). Gestão de conflitos: Desafio do mundo corporativo. São Paulo: Saraiva.
Lederach, J. P. (2012). Transformação de Conflitos. São Paulo: Palas Athena.
Por Betina Costa, mestranda em Direito com ênfase em Resolução de Conflitos, pela Ambra University. Pós-graduanda em Psicologia Positiva pela PUC/RS. Advogada consensual. Diretora Regional no Piauí do escritório Bayma & Fernandes. Presidente da Comissão de Justiça Restaurativa e Direito Sistêmico da OAB/PI, na atual gestão 2019/2021.
Fonte: Direito Profissional – 31/01/2023
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O sistema multiportas e a pessoa com deficiência

Cerca de 1/4 da população brasileira declara ter algum tipo de deficiência. São esses os dados do último Censo Demográfico divulgado pelo IBGE [1]: aproximadamente 46 milhões de brasileiros (24% da população) reconhecem ter algum grau de dificuldade em pelo menos uma das habilidades investigadas (enxergar, ouvir, caminhar ou subir degraus) ou possuir deficiência mental/intelectual.
Há diversos critérios para definir o conceito de pessoa com deficiência. A Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/15), responsável por reformular a teoria das incapacidades do modelo médico para o modelo social de deficiência, assim o fez:
“Artigo 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” [2].
O que define, portanto, a pessoa com deficiência não é a falta de um membro, tampouco quaisquer das funções ou órgãos do sentido reduzidos. Como já alertava Luiz Alberto David Araujo em sua tese de Doutorado [3]: “O que caracteriza a pessoa com deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade, de estar incluído socialmente. O grau de dificuldade para a inclusão social é que definirá quem é ou não pessoa com deficiência”.
Se a deficiência é um impedimento social tão presente na população brasileira, uma reflexão se impõe: a concepção da chamada Justiça Multiportas inclui essa significante parcela da sociedade ou apenas reforça a barreira que os métodos tradicionais de resolução de conflitos já consagram?
A ideia de Justiça Multiportas (multi-door courthouse ou multi-door system) teve origem nos estudos do professor Frank Sander, da Universidade Harvard. A ideia, em resumo, é que a atividade jurisdicional estatal não pode ser vislumbrada como a única e principal opção das partes para a solução dos litígios [4]. Há, para cada tipo de conflito, uma ou mais formas adequadas de resolução, sendo a jurisdição estatal apenas uma dessas opções.
Com a Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aliado aos avanços promovidos pelo Código de Processo Civil de 2015 (CPC), o direito brasileiro caminha para a construção de um modelo de Sistema multiportas. Outros inúmeros diplomas confirmam esse movimento, a exemplo da Lei nº 9.307/1996 (arbitragem) e da Lei nº 13.140/15 (mediação).
Dentre as vantagens destacadas pela doutrina para esse novo modelo [5], tem-se o maior protagonismo da parte na solução de seu problema, com o consequente maior comprometimento e responsabilização acerca dos resultados; o estimulo à autocomposição; a maior eficiência do Poder Judiciário, porquanto a esse caberia apenas a solução dos casos mais complexos, quando inviável a solução por outros meios ou quando as partes assim o desejassem; e a maior transparência, diante do conhecimento prévio pelas partes acerca dos procedimentos disponíveis para a solução do respectivo conflito.
Há, portanto, um inegável movimento em prol da introdução de novas formas de tratamento dos litígios, que não afastam a jurisdição estatal — como não poderia deixar de sê-lo, diante do artigo 5º, XXXV da Constituição Federal — mas que com ela coexistem, elevando a qualidade das soluções e pluralizando as formas de lidar com a conflituosidade humana.
Isso posto, questiona-se: é possível afirmar que, hoje, o Sistema Multiportas abarca em seu plano de consolidação as pessoas com deficiência? Existe algum preparo do poder público e da iniciativa privada para que pessoas com deficiência visual, auditiva, motora, mental ou intelectual usufruam dos diferentes mecanismos de resolução do conflito? Em caso negativo, é justificável recusar acessibilidade a esses métodos para cerca de 1/4 da população brasileira?
No âmbito do Poder Judiciário, o comando é claro: há que se prover essa integração.
A Resolução nº 401/2021 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) [6] dispõe sobre o desenvolvimento de diretrizes de acessibilidade e inclusão de pessoas com deficiência nos órgãos do Poder Judiciário e de seus serviços auxiliares. Trata, em síntese, da necessária eliminação de barreiras urbanísticas, arquitetônicas, informacionais, atitudinais ou tecnológicas para a garantia dessa igualdade.
Para elucidar o tamanho do desafio, são iniciativas propostas pela Resolução a capacitação de servidores em temas relativos a acolhimento, direitos, atendimento e cotidiano de pessoas com deficiência; a garantia de recursos de tecnologia assistiva, adaptações arquitetônicas e urbanísticas que permitam a acessibilidade; medidas de facilitação ao acesso e à obtenção de informações e certidões, dentre inúmeras outras medidas a serem implementadas.
Ainda no âmbito dos atos normativos editados pelo CNJ, a Resolução nº 332/2020 [7] incentiva a adoção de mecanismos de inteligência artificial e de tecnologias análogas no âmbito judicial, a serem utilizados para a promoção de bem-estar e a prestação jurisdicional equitativa a tal público.
Alinhado às diretrizes acima, o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (TJ-MT) criou a Comissão Permanente de Acessibilidade e Inclusão, cujo objetivo é desenvolver e aprimorar estratégias de acessibilidade, tanto em quesitos estruturais e físicos, quanto em termos de acessibilidade digital.
Dentre as iniciativas de destaque, o Poder Judiciário mato-grossense aderiu a ações de acessibilidade, como o uso da ferramenta VLibras no site institucional do TJ-MT, software que traduz os conteúdos do Portal em tópicos, fazendo a leitura de hiperlinks e textos em Libras. Implantou, ainda, a tradução em Língua Brasileira de Sinais nas sessões on-line de julgamentos da Segunda Instância [8], promoveu audiências de conciliação com o auxílio de tais intérpretes [9] e capacitou servidores em curso de libras [10], sempre visando à inclusão desse público aos diferentes métodos de resolução abarcados pelo Sistema Multiportas.
Fato é que o desafio continua e as deficiências são múltiplas. Exigem mudanças estruturais, seja na própria construção e idealização dos espaços de acesso a tais serviços, seja na constante capacitação de todos que se propõem a intermediar a resolução dos conflitos humanos. Juízes, advogados, promotores, defensores, conciliadores/mediadores, equipe multidisciplinar: todos inclusos.
Não é demais lembrar que o tema da pessoa com deficiência é tão caro ao legislador brasileiro que três dos quatro tratados internacionais com status de emenda constitucional no Brasil permeiam o tema: a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (Convenção de Nova York), o Protocolo Facultativo dessa Convenção e o Tratado de Marraqueche.
Ainda, é ilusório e pouco altruísta pensar que faltam demandas a justificar o investimento. O fato de não sentirmos em nosso cotidiano essa quantidade de pessoas que necessitam do acesso adaptado é menos um sinal de que essas rareiam, e mais um indicativo de que não lhes foram garantidas condições mínimas de conhecimento e acesso a todas essas opções de resolução de conflito disponíveis.
A mudança atitudinal é o alicerce da urgente, ampla e irrestrita acessibilidade das pessoas com deficiência ao Sistema Multiportas. Em tempo: não basta que sejam múltiplas: todas as portas devem ser, igualmente, acessíveis.
[1] Disponível em: Censo 2010 | IBGE. Acesso em: 14/1/2023.
[2] Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm. Acesso em: 14/1/2023.
[3] ARAUJO, Luiz Alberto David. A Proteção constitucional das pessoas portadoras de deficiência. 3ª Edição. Brasília: CORDE, 2001. Originalmente apresentada como Tese de Doutorado — Pontifícia Universidade Católica, São Paulo. Disponível em: <https://tede2.pucsp.br/handle/handle/8708>. Acesso em: 14/01/2023.
[4] CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Colaborador: Felipe Viana de Araujo Duque. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/dodpedia/detalhes/b9141aff1412dc76340b3822d9ea6c72?palavra-chave=multiportas&criterio-pesquisa=e>. Acesso em: 14/01/2023.
[5] PEIXOTO, Marco Aurélio Ventura; PEIXOTO, Renata Cortez Vieira. Fazenda Pública e Execução. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 118
[6] Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3987>. Acesso em: 14/01/2023.
[7] Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3429>. Acesso em: 14/01/2023.
[8] Disponível em: <https://www.tjmt.jus.br/noticias/70466>. Acesso em: 14/01/2023.
[9] Disponível em: < http://www.tjmt.jus.br/noticias/66536#.Y8MPAHbMKUk>. Acesso em: 14/01/2023.
[10] Disponível em: <http://www.tjmt.jus.br/noticias/60203#.Y785OXbMKUk>. Acesso em: 14/01/2023.
Por Fernanda Mayumi Kobayashi, juíza do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso e formada em Mediação de Conflitos pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 24 de janeiro de 2023, 11h15
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XIV Encontro CONIMA

O CONIMA – Conselho Nacional das Instituições de Arbitragem e Mediação, em comemoração aos seu Jubileu de Prata, realizará o seu XIV ENCONTRO CONIMA, nos dias 17 e 18 de novembro, no Hotel Atlante Plaza, em Recife/PE.
Após 2 anos de eventos totalmente virtuais, realizaremos o XIV ENCONTRO CONIMA na forma híbrida – presencial e virtual. Com isso poderemos oportunizar o contato pessoal, estabelecer novos Networking e resgatar aqueles que não pudemos encontrar nos últimos anos.
O tema do XIV ENCONTRO CONIMA será “Um sonho, muitos ideais e grandes conquistas” No dia 17 de novembro, das 14 às 17 hs, teremos o Workshop – “Constituição de Câmaras de Arbitragem e Mediação” , com abordagem de aspectos práticos. O Workshop será apenas para os participantes presenciais e haverá preço especial para inscrições do combo: Encontro + Workshop.
Informações e inscrições, clique aqui
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PLP 124/2022: propostas de alteração do Código Tributário Nacional

Como resultado dos trabalhos da Comissão de Juristas instaurada pelo Senado com vistas a promover alterações no processo administrativo e tributário nacional, foram apresentados anteprojetos de lei que resultaram no Projetos de Lei Complementar nº 124 e 125/2022 (PLP 124 e 125/2022), além dos Projetos de Lei nº 2.481, 2.483, 2.484, 2.485, 2.486, 2.488 e 2.490, todos de autoria do senador Rodrigo Pacheco, presidente da Casa.
Do rol dessas inovações legislativas, merece destaque o PLP 124/2022, que “Dispõe sobre normas gerais de prevenção de litígio, consensualidade e processo administrativo em matéria tributária”, promovendo alterações no Código Tributário Nacional (CTN).
O PLP 124/2022 introduz novos dispositivos ao CTN, altera a redação de outros e, curiosamente, não revoga nenhum dispositivo do Código.
Lamentavelmente, o PLP 124/2022 passou ao largo dos Capítulos IV e V, do Livro Segundo do CTN, salvo alteração pouco ousada introduzida ao artigo 138. Enfim, perdeu-se uma oportunidade de dar um melhor tratamento à parte do Código dedicada à sujeição passiva, reconhecida pela quase unanimidade da doutrina como o trecho de pior redação da Lei Complementar Tributária.
O PLP 124/2022 introduz ao CTN um artigo 113-A, com dois parágrafos, para tratar das penalidades pecuniárias.
De acordo com o caput do artigo 113-A, as multas por descumprimento de obrigações principais e acessórias deverão observar o princípio da razoabilidade e guardar relação de proporcionalidade com a infração praticada pelo sujeito passivo.
Os §§1º e 2º do artigo 113-A estipulam um valor máximo a ser observado na fixação de penalidades pecuniárias, de modo que as multas decorrentes de procedimentos de ofício não poderão ser superiores ao valor do tributo exigido “ou do crédito cuja fiscalização tiver sido afetada pela desconformidade ou pelo atraso na prestação das informações pelo sujeito passivo”. Também fica estabelecido que a multas por dolo, fraude, simulação, sonegação ou conluio — também chamadas de multas qualificadas — não poderão ser superiores ao dobro da multa originalmente aplicada.
Até aí o PLP 124/2022 traz louvável modificação ao Direito Positivo, incorporando ao Código aquilo que já é uma tendência nos Tribunais, valendo a pena destacar os julgamentos, pelo STF, da ADI 551 (Ilmar Galvão, DJ de 14/02/2003), do RE 657.372 (Ricardo Lewandowski, DJ de 10/06/2013) e da ADI-MC 1.075 (Celso de Mello, DJ de 24/11/2006).
A questão do teto da fixação das multas, a propósito, será analisado pelo STF no julgamento de mérito do Tema 1.195, cujo RE 1.335.293, relatado pelo ministro Nunes Marques, ainda não tem previsão de pauta.
Neste ponto, todavia, o PLP 124/2022 poderia ter sido mais ousado, determinando o fim da imposição das multas por informações incorretas em  declarações, arquivos magnéticos e/ou escrituração nos casos em que for possível a retificação, mesmo após intimação dirigida pela fiscalização. Ora, se o contribuinte é intimado para retificar o erro e corrige o equívoco no prazo fixado pela autoridade lançadora, exigir penalidade mesmo após a retificação, tal como ocorre no artigo 62-B, II, “b”, da Lei nº 2.657/96-RJ, não estimula a conformidade à legislação tributária.
Na sequência, o PLP 124/2022 altera a redação do caput do artigo 138, do CTN, para deixar claro que a denúncia espontânea também afasta a imposição da multa de mora, rechaçando qualquer interpretação de que a multa pelo atraso não tem natureza punitiva. Neste ponto, o PLP 124/2022 é digno de aplausos porque afasta terrível jurisprudência formada no STJ contrariamente aos contribuintes quanto à matéria.
Mas o PLP 124/2022 poderia ter dado dois passos além em benefício do contribuinte no tratamento da denúncia espontânea da infração.
O primeiro passo diz respeito à espontaneidade pelo cumprimento a destempo, mas antes de qualquer intimação, das obrigações acessórias.
Como se observa da simples leitura do dispositivo legal em apreço, a redação do artigo 138, do CTN, não faz distinção quanto ao cumprimento espontâneo de obrigação principal ou acessória. Pelo contrário, o dispositivo deixa claro que o pagamento do tributo devido e dos juros de mora deverá ocorrer, se for o caso. Ou seja, o próprio Código prevê que há situações em que a espontaneidade poderá ocorrer sem o pagamento do tributo devido, caso típico das obrigações acessórias.
No entanto, a jurisprudência se consolidou em sentido contrário, vedando a aplicação do instituto da denúncia espontânea no cumprimento a destempo de obrigações acessórias, estando a matéria pacificada no STJ através de incontáveis acórdãos.
Logo, o PLP 124/2022 também poderia ter deixado expresso na lei que a denúncia espontânea também se aplica às obrigações acessórias cumpridas em atraso.
O segundo passo que poderia ter sido dado em favor do contribuinte neste tema diz respeito à aplicação da denúncia espontânea nos casos de parcelamento de tributos em atraso.
Ora, se o objetivo do instituto — e do próprio PLP 124/2022 — é o estímulo dos contribuintes à conformidade, nada mais justo do que assegurar o afastamento da multa de mora àquele que, antes de qualquer procedimento de ofício, procura o fisco para regularizar sua situação, ainda que de forma parcelada, visto não possuir recursos para o pagamento à vista.
Então seria o caso do PLP 124/2022 aproveitar a oportunidade para modificar a jurisprudência firmada no STJ no Tema 101 dos Recursos Repetitivos.
O artigo 139-A do CTN, introduzido pelo PLP 124/2022, traz inovação que já é conhecida dos contribuintes do ICMS no Rio de Janeiro. Ao que tudo indica, os membros da Comissão de Juristas inspiraram-se no artigo 69-A, da Lei nº 2.657/96-RJ, para prever algo similar ao Aviso Amigável, previsto na legislação fluminense, estimulando o contribuinte à autorregularização do cumprimento de suas obrigações antes da realização de lançamentos de ofício.
Também merece destaque a alteração promovida ao artigo 142, do CTN, que pelo PLP 124/2022, passa a contar com três parágrafos. O atual parágrafo único transformou-se no §1º e dois “novos” parágrafos foram acrescentados.
O “novo” §2º do artigo 142 contém um deslize e nenhuma novidade para aqueles que conhecem a legislação tributária federal. Na verdade, à exceção do deslize, o §2º de que aqui se trata é cópia quase fiel do artigo 63, caput, da Lei nº 9.430/96.
Neste artigo 142, §2º, portanto, o PLP 124/2022 dispõe que “No lançamento destinado a prevenir a decadência de crédito tributário cuja exigibilidade houver sido suspensa na forma dos incisos II, IV e V do artigo 151 desta Lei, não será́ cominada multa de ofício ou multa de mora a ele relativo”.
Comparado ao artigo 63, da Lei nº 9.430/96, o novo §2º do artigo 142 do Código inclui a vedação de imposição de multa de mora nos lançamentos realizados para prevenir a decadência, bem como afirma — e aqui está o deslize — que as multas não serão aplicadas mesmo na hipótese da exigibilidade ter sido suspensa pelo depósito do montante integral (artigo 151, II, do CTN).
Ocorre que, à luz da jurisprudência pacífica do STJ, não cabe a realização de lançamento de ofício nos casos em que a exigibilidade do crédito tributário está suspensa por força do depósito do montante integral (EREsp 898.992, DJ 27/08/2007; EREsp 464.343, DJ 29/10/2007 e REsp 895.604, DJ 11/04/2008, entre outros).
O §3º introduzido ao artigo 142, do CTN, nada mais é do que o artigo 63, §1º, da Lei nº 9.430/96, esclarecendo que a hipótese de afastamento da penalidade nos casos especificados de suspensão da exigibilidade só terá cabimento quando o suspensão se verificar antes de qualquer procedimento de ofício, vale dizer, no mandado de segurança preventivo ou nas ações declaratórias de inexistência de relação jurídica.
A Comissão de Juristas, no que foi acompanhada pelo Senador Rodrigo Pacheco, propõe a instauração da arbitragem, quando da nomeação do árbitro, como uma das hipóteses de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, num inciso VII a ser incluído ao artigo 151, do CTN.
Também é proposta a inclusão de um inciso VIII ao artigo 151, de modo que a “a transação tributária, conforme decisão do representante da administração tributária, nos termos da legislação específica”, também suspenderá a exigibilidade do crédito tributário.
Neste caso, parece que o PLP 124/2022 está cometendo um equívoco, visto que a transação é hipótese de extinção do crédito tributário prevista no artigo 156, III que, aliás, não foi revogado pelo Projeto.
Nesta ordem de ideias, o melhor é prever que a apresentação de pedido de transação ou a adesão à transação suspendem a exigibilidade do crédito tributário até que seja proferida decisão favorável pela autoridade administrativa competente.
O PLP 124/2022, introduzindo novo paradigma à conflituosa relação fisco-contribuinte, estimula os métodos alternativos para resolução de conflitos. Dentro deste espírito, a sentença arbitral favorável ao sujeito passivo transitada em julgado passa ser mais uma modalidade de extinção do crédito tributário (artigo 156, XII).
Na sequência, o projeto introduz um parágrafo 3º ao artigo 161 do CTN, que nada mais do que a reprodução do artigo 63, §2º, da Lei nº 9.430/96, afirmando, desta vez em lei complementar nacional, que “A interposição da ação judicial favorecida com medida liminar ou antecipação de tutela interrompe a incidência da multa de mora, desde a concessão da medida judicial, até 30 dias após a data da publicação da decisão judicial que considerar devido o tributo”.
Quanto à transação tributária, o PLP incorpora ao artigo 171, do CTN, as modalidades de transação previstas pelo legislador federal na Lei nº 13.988/2020.
A rigor, esta matéria deveria permanecer sob a disciplina de lei ordinária, como aliás vem recorrendo em vários entes da federação. Disciplinar minuciosamente a transação em lei complementar pode causar indesejável engessamento e inibir o legislador ordinário de dispor de forma ampla sobre as hipóteses de acordo.
Os artigos 171-A e 171-B, no mesmo afã de introduzir soluções alternativas para a solução de litígios, dispõem que a arbitragem e a mediação serão utilizadas na solução das lides tributárias.
Consequentemente, o artigo 174, parágrafo único, do CTN, passa a dispor que a instauração do procedimento de mediação e a assinatura do compromisso arbitral serão causas de interrupção do prazo prescricional.
Novidade importante e muito bem-vinda é encontrada no artigo 194-A e no artigo 211-A, ambos estabelecendo critérios de dosimetria para a graduação das penalidades.
O artigo 194-B prevê que as decisões transitadas em julgado no STF e no STJ, em  Repercussão Geral ou nos Recursos Repetitivos favoráveis ao sujeito passivo, terão eficácia vinculante à Administração Tributária. Todavia, o Projeto prevê que a Fazenda Pública terá o prazo de 90 (noventa) dias para baixar os atos normativos necessários a adoção do que restou decidido no Tribunais Superiores.
Considerando a eficácia erga omnes e o efeito vinculante das decisões em Repercussão Geral/Recursos Repetitivos, a adoção de atos administrativos normativos pela Administração Tributária é totalmente desnecessária, não havendo motivo razoável para diferir a aplicação dos precedentes.
Com efeito, o PLP 124/2022 poderia aproveitar o ensejo para dispor que o reconhecimento de repercussão geral pelo relator no STF, a exemplo do disposto no artigo 1.035, §5º, do Código de Processo Civil, também suspende todos os processos administrativos fiscais versando sobre a mesma matéria.
O artigo 194-C, proposto pelo PLP 124/2022, deixa expresso que o processo de consulta tributária existe, porém traz perigosa inovação ao dispor que a solução de consulta “será observada em relação a todos os demais sujeitos passivos não consulentes que se encontrem nas mesmas situações fáticas e jurídicas, nos termos da legislação específica”.
Em seguida, o PLP 124/2022 cria todo um novo Capítulo ao Título IV do CTN (Capítulo IV) para traçar as normas gerais do processo administrativo tributário.
Percebe-se entre os artigos 208-A e 208-I que o PLP 124/2022 teve forte inspiração no Decreto nº 70.235/72 – que está sendo revogado pelo PL 2483/2022.
O artigo 208-B prevê os requisitos formais de validade de um auto de infração, todavia ignora a possibilidade de lançamentos de ofícios serem materializados por outros atos administrativos, tais como as notas ou notificações de lançamento. O mesmo dispositivo não indica como requisito de validade a indicação de local e data da lavratura, mas isto pode causar confusão na identificação de possível extinção pela decadência, sobretudo quando não constar manifestação expressa da ciência pelo sujeito passivo. Considerando que as legislações dispõem sobre a autoridade competente para a constituição do crédito tributário, seria conveniente que, ao menos a indicação do cargo ou função do autuante constasse como requisito de validade.
O artigo 208-C, I, prevê, desnecessariamente, que a impugnação tempestiva suspende a exigibilidade do crédito tributário. Ora, se o artigo 151, III, não foi alterado, este novo inciso I não precisa existir. Os incisos II, III, IV e VI são muito bem-vindos, confirmando a existência de um duplo grau de “jurisdição” no processo administrativo fiscal, tal como previsto na melhor interpretação do artigo 5º, LV, da Constituição.
Ainda no artigo 208-C, observa-se que o inciso V merece aprimoramento. Ao dispor que a uniformização das decisões divergentes somente ocorrerá quando houver uma instância superior, o PLP 124/2022 acaba por esvaziar esta importante fase do processo administrativo fiscal, responsável pela estabilização do processo e concretização da segurança jurídica. Deste modo, o melhor é deixar expresso que haverá uma instância especial com competência para apreciar os recursos objetivando a uniformização da coletânea de julgados administrativos.
Nesta mesma ordem de ideias, devem ser ajustados o inciso III e o §1º do artigo 208-D.
Digno dos maiores aplausos é o artigo 208-E, que deixa definitivamente de lado a ideia de uma possível revisão, via recurso hierárquico, das decisões definitivas favoráveis ao sujeito passivo.
A exemplo do que ocorre em relação ao artigo 194-B, também caberia no artigo 208-G a previsão de suspensão do processo administrativo tributário nos casos em que o relator no STF ou no STJ identificar matéria a ser apreciada pelo rito da Repercussão Geral ou dos Recursos Repetitivos.
Seria muito bom se o artigo 208-H também autorizasse a realização de intimações na pessoa do procurador ou advogado do sujeito passivo, a exemplo do que ocorre no âmbito do processo judicial.
Considerando o período eleitoral, dificilmente haverá avanço na tramitação do PLP 124/2022 num curto prazo. De todo modo, diante da grande repercussão da matéria, será bastante conveniente que o Congresso Nacional promova audiências públicas para maior discussão do PLP 124/2022 visto que as sugestões da Comissão, como se vê, merecem aprimoramentos.
Por João Luís de Souza Pereira, advogado, mestre em Direito e professor convidado da pós-graduação lato sensu da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ) e da Escola de Negócios da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (IAG/PUC-RJ).
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 4 de outubro de 2022, 16h02
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Autocomposição como forma de solução de conflitos em tempos de pandemia

1. A crise pandêmica
Em razão das medidas emergenciais e excepcionais de lockdown determinadas pelo poder público, preservando-se a vida (artigo 5º, caput, da Constituição) em detrimento das liberdades individuais (artigo 5º, inciso XV, da Constituição), os tribunais [1] decidiram pela suspensão do curso dos prazos processuais [2]. A paralisação, entretanto, agravou ainda mais a morosidade das ações e trouxe prejuízos infindáveis aos jurisdicionados.
Com os fóruns fechados, advogados e advogadas permaneceram por um longo período sem receber honorários advocatícios oriundos de valores depositados em processos judiciais, pois suspensas as expedições de precatórios, mandados de levantamento e requisições de pequenos valores. Ignorando-se o caráter alimentar da verba honorária.
Diante da mínima atividade jurisdicional [3] e o conseguinte choque para com o princípio da celeridade processual (artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição), mostrou-se necessária a adoção de meios alternativos à jurisdição para a solução de conflitos.
O cenário pandêmico gerou uma mudança de paradigma, diante da impossibilidade — ainda que momentânea — de ganhos.
2. Métodos de solução de conflitos
Como formas de solução de conflitos, tem-se a divisão: autotutela, heterocomposição e a autocomposição.
A autotutela é a solução do litígio pelas próprias partes, mediante a utilização da força física, moral ou econômica. Apesar de vedada (GONÇALVES, 2020, p. 36), ainda há resquícios no ordenamento jurídico — a exemplo do desforço imediato (§ 1º do artigo 1.210 do Código Civil) e do direito de retenção (artigos 571 e parágrafo único, 578, 663, 681, 708, 742, 1.219, 1.220, do Código Civil).
Acerca da heterocomposição, solução determinada por terceiro, encontram-se: a jurisdição (artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição) e a arbitragem (Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996).
Autocomposição é a solução do litígio determinada de acordo com a autonomia de vontade das partes (DA SALLES et al., 2021, p. 143). São formas: a conciliação, a mediação (indiretas) e a negociação (direta) (Ibid., p. 143).
Por conta de uma maior aceitação da sociedade, a jurisdição, uma das formas de heterocomposição, tornou-se a principal forma de solucionar conflitos.
O termo jurisdição possui origem latina e advém da palavra juris dictio, que significa dizer o direito. Trata-se de uma das funções do Estado a aplicação da lei a um determinado caso, isso em substituição a vontade das partes, observando-se, sempre, a imparcialidade. Compete, por regra, aos órgãos do Poder Judiciário [4].
Ao longo dos anos, contudo, mostrou-se falha, pois tardia e insatisfatória às partes, em vista de não equilibrar dois princípios conflitantes para a materialização da segurança jurídica (artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal): o da celeridade processual e o da ponderação. A rapidez diminui a qualidade da decisão e a qualidade abate a rapidez (ZANARDO, 2010, p. 10).
Conforme Boletim Estatístico do Superior Tribunal de Justiça (BOLETIM, 2022) e a título exemplificativo, apenas no mês de março de 2022 a Corte Superior recebeu 38.604 novos processos, num acervo final de 268.661 processos, tornando-se inegável o grande volume de ações.
O Supremo Tribunal Federal, composto por apenas 11 ministros (artigo 101 da Constituição), encontra-se com um acervo de 21.276 processos (ACERVO, 2022), maior parte (8.330) de Agravo em Recurso Extraordinário (ARE). Para cada Ministro, numa distribuição hipotética igualitária, há, em média, 1.934 processos [5].
Necessário ressaltar, entretanto, que o modelo conciliatório já vinha sendo utilizado há muitos anos pelo Processo do Trabalho. A Consolidação das Leis do Trabalho, Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, já previa a conciliação nos dissídios individuais ou coletivos (artigo 764). A obrigatoriedade conciliatória ao final da audiência constava desde 1943 (artigo 850). Contudo, a obrigação de composição inicial foi trazida apenas em 1995, conforme redação dada pela Lei nº 9.022 (artigo 846).
É certo que a nova perspectiva processual trazida pelo Código de Processo Civil com a promoção, a qualquer tempo (artigo 139, inciso V, CPC), da autocomposição (§ 3º do artigo 3º), tenta resgatar o equilíbrio da celeridade processual e o da ponderação, a fim de materializar a segurança jurídica.
Verifica-se, desse modo, a assaz necessidade e a importância na adoção de métodos alternativos à jurisdição para a solução de conflitos.
3. A solução de conflitos em tempos de pandemia
O Conselho Nacional de Justiça, numa tentativa de uniformizar os entendimentos, quando do início da crise pandêmica, editou a Resolução 313, que estabeleceu o regime de plantão extraordinário, mas sem dispor de medidas para a retomada do curso dos prazos processuais.
Somente através da Portaria nº 61, de 31 de março de 2020, decidiu acerca de uma Plataforma Emergencial de Videoconferência para a realização de audiências e sessões de julgamento nos órgãos do Poder Judiciário (artigo 1º). Tardiamente, em 20 de abril de 2020, editou nova Resolução, 314, tomando por regra as audiências virtuais (§ 3º do artigo 6º), mas com modelo de livre escolha, pelos tribunais, de plataformas.
Os advogados e as advogadas, diante da necessidade de sobrevivência, foram tomados pela iniciativa de aproximar as partes e buscar pela solução da lide.
Na época, a circulação de pessoas era mínima. Não se permitiam aglomerações, pois tais medidas seriam necessárias ao combate ao vírus.
Nesse cenário, houve uma eclosão na utilização de videoconferências — e lives. Através desse sistema, tornou-se possível a autocomposição online.
Cite-se:
“A expressão On-line Dispute Resolution (ODR) retrata a utilização de tecnologia da informação e da comunicação para compor conflitos, sendo tal uso referente à totalidade do procedimento ou somente a parte dele.
[…]
Para quem pode usufruir do acesso às redes eletrônicas, há evidentes vantagens, como economia de tempo, de dinheiro e conveniência por não haver gasto com deslocamentos. Contudo, apesar dos benefícios, a realização de sessões consensuais eletrônicas apresenta desafios ligados a fatores como dificuldade de acesso a meios tecnológicos (acentuada por desigualdades socioeconômicas), instabilidade da rede, distanciamento da parte com advogadas(os) e necessária adaptação à diferente forma de interação” (DA SALLES et al., 2021, p. 252).
Distâncias foram reduzidas e a comunicação foi alargada:
“Com a impossibilidade de encontros presenciais e a acelerada virtualização das relações, vimos um aumento exponencial do uso de plataformas de comunicação síncrona, em que as interações são realizadas simultaneamente, geralmente por meio e vídeo e/ou áudio para reuniões, aulas e encontros sociais. A familiarização com essas vias facilitou seu uso para audiências judiciais, inclusive de mediação e de conciliação. É de se esperar que esse movimento se consolide mesmo após a pandemia, dada a redução de custos e de deslocamentos decorrente de sua prática” (ASPERTI et al., p. 84). (grifo nosso)
O acesso à internet possibilitou, assim, a autocomposição.
Entretanto, não se quer negar as dificuldades do meio. Apesar de ser considerada como essencial [6], há inúmeras dificuldades, sociais e técnicas: nem todos possuem meio de acesso à conexão [7], alguns aparelhos não estão aptos em receber tecnologias atuais [8] e algumas pessoas possuem dificuldades técnicas no domínio das ferramentas virtuais.
Cite-se:
“É inadequado impor mediação ou conciliação digital quando a estrutura para que ela aconteça não pode ser provida aos vulneráveis. Nessa linha, ocorrendo instabilidade na conectividade não deverá haver deletéria consequência processual — exceto a redesignação —, arcando as partes com o ônus de suportar mais tempo para a resolução do conflito em curso” (ASPERTI et al., 2020, p. 208).
Diante das dificuldades apontadas, é necessária a busca por um início de comunicação em épocas de restrição da circulação e de atividade mínima judicial.
A primeira, através do telefone. Numa ligação cria-se um princípio de interação que possibilitará na finalização do ato negocial. Ainda que de forma um pouco mais arcaica, os serviços postais não deixaram de ser prestados, e foram considerados essenciais na época (artigo 3º, § 1º, inciso XXI, do Decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020). Poderão ser utilizados para um início de comunicação.
É certo que o cenário pandêmico redescobriu um leque de opções para a aproximação de pessoas. As ferramentas já estavam à disposição, mas foram essenciais na redução de distâncias em épocas de confinamento. Através delas, tornou-se possível a autocomposição online, uma das poucas saídas para os advogados e advogadas em tempos de crise, decorrente da suspensão do curso dos prazos processuais e a mínima atividade jurisdicional.
4. Conclusão
Conclui-se que a suspensão do curso dos prazos processuais trouxe prejuízos nefastos aos jurisdicionados e à advocacia, tornando-se necessária a utilização dos métodos alternativos na solução de conflitos.
Através da conciliação, mediação ou negociação, abate-se a carga emocional das partes trazida pelo litígio, resolvendo-o de forma rápida e com a menor onerosidade possível. Especialmente em tempos de pandemia, a autocomposição online constitui forma essencial, numa mudança ainda que momentânea de paradigma: da heterocomposição (jurisdição) para a autocomposição.
Os sujeitos processuais, além do dever de preservar a boa-fé (objetiva), são obrigados a cooperar entre si a fim de obterem, a justo prazo, solução definitiva da lide. Em sua essencialidade, a internet contribui para o desenvolvimento dessas relações e ressignifica o princípio da duração razoável do processo, ponderando-se princípios e materializando a segurança jurídica.
São inúmeros os meios redescobertos através da pandemia e à disposição da parte para iniciativa da autocomposição.
Em tempos de crise, a melhor solução é dialogar.
Referências
ACERVO do STF em 2022. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: https://transparencia.stf.jus.br/single/?appid=e554950b-d244-487b-991d-abcc693bfa7c&sheet=9123f27b-bbe6-4896-82ea-8407a5ff7d3d&theme=simplicity&select=clearall. Acesso em 27 de abr. 2022.
ASPERTI, Cecilia; TARTUCE, Fernanda. A conciliação e a mediação online a partir da pandemia do novo Coronavírus: limites e possibilidades. Revista do Advogado, AASP, v. n. 148 (no prelo).
BOLETIM estatístico. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: https://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Boletim/verpagina.asp?vPag=0&vSeq=374. Acesso em 27 de abr. 2022.
DA SALLES, Carlos Alberto D.; LORENCINI, Marco Antônio Garcia L.; SILVA, Paulo Eduardo Alves. Negociação, Mediação, Conciliação e Arbitragem. São Paulo: Grupo GEN, 2021. 9786559640089. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559640089/. Acesso em: 27 abr. 2022.
DIDIER JR. Fredie. Novo código de processo civil: comparativo com o código de 1973. Fredie Didier Jr. e Ravi Peixoto. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016.
GONÇALVES, Marcus Vinicius R. Esquematizado – Direito processual civil. Editora Saraiva, 2020. 9786555590043. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786555590043/. Acesso em: 27 abr. 2022.
HANTHORNE, Bruna de Oliveira Cordeiro. Métodos consensuais de solução de conflitos. Curitiba: InterSaberes, 2022.
NEVES, Daniel Amorim A. Novo CPC – Código de Processo Civil – Lei 13.105/2015. 3ª edição. São Paulo: Grupo GEN, 2016. 9788530970321. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530970321/. Acesso em: 28 de abr. 2022.
PESQUISA mostra que 82,7% dos domicílios brasileiros têm acesso à internet. Disponível em: https://www.gov.br/mcom/pt-br/noticias/2021/abril/pesquisa-mostra-que-82-7-dos-domicilios-brasileiros-tem-acesso-a-internet, acesso em 29/04/2022. Acesso em 29/4/2022, às 10h14
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos Conflitos Civis. São Paulo: Grupo GEN, 2020. 9788530992330. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530992330/. Acesso em: 29 abr. 2022.
ZANARDO, Tiago Salatino. Relativização da coisa julgada. 2010. 1 disco laser + 4¾ pol. Trabalho de conclusão de curso (graduação em Direito) – Universidade Católica de Santos, 2010.
[1] O Conselho Nacional de Justiça, numa tentativa de uniformizar os entendimentos, editou a Resolução 313, que estabeleceu o regime de plantão extraordinário, no âmbito do Poder Judiciário, excetuando-se o Supremo Tribunal Federal e a Justiça Eleitoral.
[2] No Estado de São Paulo, o Conselho Superior da Magistratura editou o Provimento CSM nº 2545/2020, para o fim de determinar a suspensão dos prazos processuais, atendimento ao público, audiências de custódia e as Sessões do Tribunal do Júri.
[3] Atos urgentes, processos com réu preso e menor infrator não foram afetados.
[4] Outros Poderes poderão exercer a jurisdição através de suas funções atípicas.
[5] Número meramente exemplificativo no intuito de indicar o volume excessivo de processos.
[6] Conforme Decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020, foram consideradas essenciais as atividades de telecomunicações e internet, a teor do art. 3º, § 1º, inciso VI.
[7] Apenas 82,7% dos domicílios brasileiros têm acesso à internet (PESQUISA, 2022).
[8] Os principais aplicativos de videochamada: Zoom MeetingsGoogle Meet (antigo Hangouts), Microsoft TeamsWhatsApp e Skype.
Por Tiago Salatino Zanardo, advogado especializado na área cível, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito pela Universidade Católica de Santos, pós-graduado em Direito Processual Penal e em Direito Processual do Trabalho pela Universidade Católica de Santos, pós-graduado em Processo Civil pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e relator do Tribunal de Ética e Disciplina — 14ª Turma Disciplinar da Ordem dos Advogados do Brasil.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 19 de agosto de 2022, 12h11
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