Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem

Especializada em Técnicas Pacíficas de Resolução de Conflitos

Defensoria tem perfil para ser ombudsman na solução extrajudicial de conflitos

O artigo 4º, II da Lei Complementar 80/1994 dispõe ser função institucional da Defensoria Pública promover, prioritariamente, a solução extrajudicial dos litígios, visando à composição entre as pessoas em conflito de interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais técnicas de composição e administração de conflitos. A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos, aliás, “deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público” (conforme artigo 3º, parágrafo 3º do CPC).
Como informa Fernanda Tartuce:
“Ante a ineficiência na prestação estatal da tutela jurisdicional, especialmente pelo perfil contencioso e pela pequena efetividade em termos de pacificação real das partes, os meios diferenciados vêm deixando de ser considerados ‘alternativos’ para passar a integrar a categoria de formas ‘essenciais’ de composição de conflitos (jurídicos ou sociológicos), funcionando como efetivos equivalentes jurisdicionais ante a substituição da decisão do juiz pela decisão conjunta das partes”[1].
De tão importante, a previsão de atuação extrajudicial da Defensoria Pública passou a constar expressamente no texto da Constituição Federal com o advento da Emenda Constitucional 80 de 2014:
Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.
Diversos instrumentos podem ser utilizados com tal finalidade. O próprio inciso II do artigo 4º, acima citado, menciona a mediação, a conciliação e arbitragem, finalizando com a previsão de que poderão ser ainda utilizadas “demais técnicas de composição e administração de conflitos”. Essa cláusula revela que o rol ali constante é exemplificativo.
No Direito Comparado, é possível identificar diversas técnicas “alternativas” (ou diferenciadas) de solução de controvérsias. Merece destaque, “além das clássicas negociação, mediação e conciliação, a figura do ombudsman, instituição com a tarefa de pesquisar queixas e prevenir disputas, facilitando sua resolução interna corporis”[2].
Por suas atribuições e disciplina normativa, a Defensoria Pública tem potencial e perfil para exercer o papel de ombudsman, sem exclusão de outros atores que possam, igualmente, desempenhar o papel. A autonomia da instituição e suas finalidades institucionais permitem concluir que a Defensoria Pública exerce a função de ombudsman, conforme concluiu Daniel Sarmento. Para o estudioso, as características institucionais e a missão constitucional da Defensoria Pública permitem o seu enquadramento como ombudsman[3].
A busca pela solução extrajudicial, visa, indubitavelmente, reduzir o volume de demandas judicias, combatendo o grande número de judicializações e ajudando a desafogar a máquina judiciária, nada obstante não se vede a homologação judicial dos acordos celebrados. Nessa linha, a legislação previu que o acordo realizado com a participação do defensor público tem natureza de título executivo extrajudicial, podendo, assim, ser executado em caso de descumprimento:
LC 80/1994. Art. 4º. § 4º O instrumento de transação, mediação ou conciliação referendado pelo Defensor Público valerá como título executivo extrajudicial, inclusive quando celebrado com a pessoa jurídica de direito público.
CPC/2015. Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: IV – o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos transatores ou por conciliador ou mediador credenciado por tribunal.
Dentre inúmeros exemplos reais de sucesso, cito caso envolvendo comunidade indígena no Amazonas, que resultou na resolução da questão, por meio da matrícula de cerca de 100 crianças indígenas em escola pública, além da instalação de local apropriado, dentro da própria comunidade, para atividades específicas da educação indígena.
A aproximação com a sociedade civil e grupos vulneráveis reforça o perfil de ombudsman da Defensoria Pública. Ainda nesse aspecto, importa observar que a busca pela solução extrajudicial não necessita aguardar a apresentação de uma demanda no órgão. Ciente de seu papel, o defensor público, como agente de transformação social, imbuído da função de promover a difusão e a conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do ordenamento jurídico (artigo 4º, III da LC 80/94), deve levar à comunidade acesso ao conhecimento, acerca de seus direitos, capacitando, por meio de sua presença regular, agentes responsáveis por núcleos de mediação populares, com o objetivo de possibilitar a solução de pequenos conflitos pelos próprios moradores do local. A medida busca, portanto, a criação de uma cultura de autotutela, como alternativa à solução de conflitos via Poder Judiciário, inclusive como forma de permitir o aprimoramento qualitativo na prestação dos serviços na seara judicial, através da redução do número de demandas ajuizadas.
[1] TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. 3. ed. São Paulo: Método, 2016. p. 148-149.
[2] TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. 3. ed. São Paulo: Método, 2016. p. 148-153.
[3] SARMENTO, Daniel. Dimensões constitucionais da defensoria pública da união.
Por Edilson Santana Gonçalves Filho, defensor público federal e especialista em Direito Processual.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 9 de maio de 2017, 8h05
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Arbitragem na Reforma Trabalhista

A Reforma Trabalhista, recentemente aprovada pela Câmara dos Deputados e ainda sujeita à apreciação do Senado, autoriza a arbitragem nos contratos individuais de trabalho (novo art. 507-A da CLT), desde que (i) a remuneração do empregado seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social; e (ii) a cláusula compromissória seja pactuada “por iniciativa do empregado ou mediante sua concordância expressa, nos termos previstos na lei 9.307 [Lei de Arbitragem].”
Trata-se de avanço para a arbitragem no Direito do Trabalho, considerando a jusprudência do TST em geral refratária à arbitrabilidade de direitos trabalhistas individuais, bem como o veto presidencial ao artigo aprovado na Reforma da Lei de Arbitragem que permitiria arbitragem envolvendo relações de emprego de administradores ou diretores estatutários.
O maior uso da arbitragem tende a ser benéfico ao contencioso trabalhista, em vista da sua maior celeridade comparado à Justiça do Trabalho. Além disso, o caráter consensual do procedimento na arbitragem, construído pelos próprios litigantes, está em linha com o espírito da Reforma Trabalhista, de maior ênfase a acordo entre as partes.
Um dos grandes receios da arbitragem trabalhista é a capacidade econômica do empregado arcar com os seus custos, mais elevadas do que os da Justiça do Trabalho, especialmente se considerarmos a potencial hipossuficiência de boa parte dos reclamantes. A Reforma Trabalhista cuida disso ao permitir arbitragem tão somente para empregados com maior remuneração. Há de se pensar, ainda, em se prever árbitro único e procedimento simplificado em determinados casos, para reduzir custos.
Outra grande preocupação está em se evitar que o empregado firme cláusula compromissória sem que tenha a exata noção das consequências. Afinal, a Justiça do Trabalho é mais barata e tende a proteger o empregado. Assim, a princípio o empregado só decidirá ir para a arbitragem se confiar no instituto e tiver algum interesse específico que justifique a escolha, tal como rapidez. Daí a necessidade de consentimento expresso, pois não se pode presumir que o empregado abriu mão do foro que lhe é mais familiar.
Interessante notar que a redação do novo artigo da CLT impõe a necessidade de o empregado tomar iniciativa ou concordar expressamente com cláusula compromissória. A reforma da Lei de Arbitragem continha dispositivo análogo, infelizmente vetado, tanto para arbitragens trabalhistas com altos executivos quanto para relações de consumo, só que se referindo ao requisito de iniciativa ou consentimento com a instituição da arbitragem. Entendo, assim, que a nova sistemática será distinta. Não se trata aqui de condição de eficácia da cláusula compromissória, a ser aferida quando surgir o litígio, isto é, o empregado terá que começar a arbitragem ou concordar com sua instituição. A nosso ver, trata-se sim de condição de validade da cláusula arbitral, a ser avaliada quando o empregado firmá-la. Ou seja, na contratação o empregado deverá ou sugerir a cláusula arbitral ou concordar expressamente com ela. Em contrato de trabalho de adesão, essa concordância expressa se provará com a cláusula arbitral estando em negrito ou em documento separado, com assinatura específica, na forma do art. 4º, parágrafo terceiro, da Lei de Arbitragem. Em contratos de trabalho que não sejam padrão e que forem livremente negociados entre patrão e empregado que não for hipossuficiente, a própria existência da cláusula arbitral denotará a concordância expressa.
De qualquer forma, se realmente aprovada a autorização da arbitragem trabalhista para trabalhadores de maior renda, enfrentaremos o desafio de superar as desconfianças e comprovar que o instituto pode ser benéfico não só ao empregador, como também ao empregado. Estamos otimistas que isso seja possível, especialmente diante da maior rapidez do foro arbitral e da possibilidade de discutir questões mais específicas, distintas da realidade do trabalhador “chão de fábrica”.
_______________
Por Joaquim de Paiva Muniz, sócio do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados.
Fonte: Migalhas – segunda-feira, 8 de maio de 2017
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XIII Conferência de Arbitragem Internacional do Rio de Janeiro

Em sua décima terceira edição a Conferência de Arbitragem Internacional do Rio De Janeiro discutirá os aspectos relevantes do Erro na Arbitragem.
Como já é tradição reuniremos os maiores especialistas para debater em conjunto com a audiência os impactos do erro no processo arbitral.
Outras informações/inscrição, clique aquixiii_conferencia_arbitragem_internacion_rj_2017 XIII Conferência de Arbitragem Internacional do Rio de Janeiro
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A quem cabe julgar contratos de concessão de petróleo?

Em caso inédito, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai decidir sobre um conflito de competência entre a justiça federal e o tribunal arbitral para julgar contratos de concessão de petróleo. O caso envolve a Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI) e o Tribunal Regional Federal da 2ª Região.
Os ministros vão definir a competência para apreciar questões atinentes à existência, à validade e à eficácia de cláusula compromissória de contrato estabelecido entre a Petróleo Brasileiro S/A Petrobras e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
O princípio que está em jogo é da competência competência. A questão é: quem decide sobre a competência do tribunal arbitral é o próprio tribunal arbitral?
No caso, a ANP firmou contrato de concessão com a Petrobras, em agosto de 1998, para exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural.
Acontece que, a ANP defende que quem decide sobre a competência do tribunal arbitral é o próprio tribunal arbitral. Isso porque, segundo a agência, todos os contratos de petróleo têm cláusula arbitral e as questões relacionadas aos contratos de concessão historicamente devem ser decididas por meio da arbitragem.
A Petrobras, por sua vez, interpreta afirma que há um impedimento para que o Tribunal Arbitral impusesse cobranças e pagamentos de Participação Especial do Estado.
Primeiro a votar, o relator do caso, ministro Napoleão Nunes Maia Filho afirmou que se prevalecesse o entendimento do princípio da competência competência estaria afastada a jurisdição. Além disso, afirmou que a escolha pela CCI para realizar a arbitragem poderia geral uma eventual ofensa à soberania nacional.
Na sessão desta semana, a ministra Regina Helena Costa, que havia pedido vista do processo, defendeu a manutenção da arbitragem como segurança jurídica e declarou competente o tribunal arbitral da CCI.
A ministra afirmou que a arbitragem está prevista nos contratos de concessão, além da validade do procedimento de o tribunal arbitral decidir sobre a sua própria competência.
Após o voto de Regina Helena, o relator Maia Filho pediu vista regimental para melhor analisar o caso.
Ainda vão votar os ministros Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Gurgel de Faria e o ministro Francisco Falcão. Falcão poderá se declarar impedido de votar, já que ele não participou da sessão de julgamento que começou a analisar o caso.
Competência competência
Atuando no processo como amicus curiae, o Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP) afirma que o princípio da competência competência jamais afastará o princípio da inafastabilidade da jurisdição.
O instituto sustenta que a escolha da CCI para a arbitragem significa apenas que as partes se submeterão aos procedimentos previstos pela CCI. Além disso, aponta para o inciso X do artigo 43 da Lei 9.478 define que o contrato de concessão como cláusula essencial tem a conciliação e a arbitragem.
“A CCI apenas administra esses procedimentos. A arbitragem tem a sede no Rio de Janeiro e a lei aplicada ao procedimento arbitral é a lei brasileira, então nós entendemos que não há qualquer ofensa à soberania”, afirmou Cristiane Romano, advogada do Machado Meyer Advogados.
“O que o IBP defende é a segurança jurídica nos contratos de concessão. Ou seja, se está prevista no contrato a cláusula arbitral e foi com base numa das premissas para assinatura do contrato de concessão, essa arbitragem deve prevalecer em razão da segurança jurídica”, concluiu a advogada.
Por Livia Scocuglia – BRASÍLIA
Fonte: Jota – 01 de Maio de 2017 – 19h25

A arbitrabilidade de dissídios individuais e a reforma

Na última quarta-feira (26), foi aprovado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) n° 6.787/2016, a chamada Reforma Trabalhista, que altera a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT) “a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho”. As alterações são de extrema relevância e abrangência, assegurando maior respeito à autonomia da vontade, tanto coletiva quanto individual, e trazendo alternativas para desafogar a Justiça do Trabalho e acabar com a exagerada judicialização das relações de emprego no País. Uma dessas medidas é a previsão de arbitrabilidade de conflitos envolvendo empregados em cargos de maior hierarquia, ocupados por profissionais com maior grau de instrução e sem a figura da hipossuficiência presente na maioria das relações de emprego.
Apesar de rara, a resolução de temas de competência da justiça do trabalho por meio de arbitragem não é novidade, sendo prevista constitucionalmente para a resolução de dissídios coletivos[1], bem como nas legislações específicas sobre o direito de greve (Lei 7.783/89)[2], sobre a participação nos lucros e resultados (Lei 10.101/00)[3] e o regulamento das atividades portuárias (Lei 2.815/13)[4]. A novidade, então, é a possibilidade de opção, em comum acordo por empregadores e empregados com maior posição hierárquica, de discussão de direitos individuais pela via arbitral, retirando a obrigação hoje existente de judicialização dos dissídios.
Assim dispõe o artigo 507-A do Projeto de Lei: “Nos contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social poderá ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem, desde que por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância expressa, nos termos previstos na Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996”. Hoje, a cláusula compromissória seria permitida apenas para empregados com remuneração superior a R$ 11.062,62[5], o que corresponde a cerca de 2{090ae30b5a2de34e6896ba6ffc156d967cd5360bfbe023e73084a754d61d15a5} dos empregados do país.
Disposição semelhante[6] estava prevista no projeto da Lei nº 13.129/15, que reformou recentemente a Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/1996), que dispunha que o conflito seria arbitrável desde que o empregado ocupasse cargo ou função de administrador ou de diretor estatutário. O dispositivo, apesar de ter sido aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, foi vetado pelo então vice-presidente Michel Temer, em razão da criação de “distinção indesejada entre os empregados” (desconsiderando que a distinção já existe, seja nas funções, salários, escolaridade etc.) e da utilização de termos (nomenclatura de cargos) que não estariam definidos tecnicamente na legislação trabalhista, o que colocaria em risco os trabalhadores.
Como se vê, as duas disposições, apesar de definirem critérios objetivos distintos – sendo no projeto da Reforma da Lei de Arbitragem a posição hierárquica e no caso do projeto da Reforma da Lei Trabalhista a remuneração – o perfil de empregado que ambos projetos buscaram alcançar é o mesmo. Afinal, elevada remuneração, por regra, é paga a empregados com grau de escolaridade avançado e pleno discernimento de suas atividades, com condições de negociar termos contratuais com as empresas a fim de definir as cláusulas finais do documento, diretamente ou mediante a contratação de assessoria jurídica. Tal fato afasta a categoria de empregados abrangidos pelo artigo 507-A do PL dos princípios protetivo e da irrenunciabilidade de direitos que norteiam o direito do trabalho, pois ausente a figura do hipossuficiente ao qual seria necessário proteger.
Importante destacar, ainda, que na situação em tela, a opção pela solução de eventuais litígios por meio da arbitragem não constitui renúncia a qualquer dos direitos materiais advindos da relação de trabalho – todos podem ser apreciados pelo tribunal arbitral caso as partes a este outorguem jurisdição –, mas tão somente renúncia à jurisdição estatal a benefício da jurisdição arbitral. Aliás, um dos pilares fundamentais da arbitragem é a manifestação de vontade expressa e escrita das partes de submeterem eventual litígio a um tribunal arbitral. Verificado que ambas as partes têm plenas condições de expressar a sua vontade, bem como que vício de consentimento não é presumível, fundamentalmente com empregados em cargos de alta remuneração, não há óbice para conceder a elas o direito de escolher a forma pela qual seus litígios serão solucionados.
Contudo, diante da determinação prevista no artigo 1º da Lei de Arbitragem, segundo a qual são arbitráveis apenas direitos patrimoniais e disponíveis, e considerando as divergências existentes quanto à disponibilidade dos direitos trabalhistas, importante tecer algumas considerações sobre a arbitrabilidade objetiva de demandas que envolvam contratos individuais de trabalho.
Isso porque, na prática, é pacífico que mesmo os direitos sociais são renunciáveis, haja vista que diariamente na Justiça do Trabalho são homologados acordos judiciais em que o empregado dá quitação ampla e irrestrita do contrato de trabalho, mesmo que na reclamatória estejam sendo discutidos diversos direitos ausentes no acordo. Ou seja, a justiça do trabalho não considera irrenunciável nenhum direito, apenas exige que passe pelo seu crivo, o que, convenhamos, pode perfeitamente ser substituído pelo crivo arbitral. Outro exemplo é a previsão contida também no Projeto de Lei acerca da possibilidade da celebração de acordos extrajudiciais, igualmente quitando integralmente a relação. Não há, pois, qualquer óbice no que tange à arbitrabilidade objetiva desses litígios.
Pode-se suscitar, ainda, que o custo do procedimento arbitral – significativamente mais alto do que o custo do litígio judicial, principalmente ao se considerar que o empregado, em regra, é considerado isento do pagamento de custas – constituiria um obstáculo à viabilidade de submeter questões trabalhistas à arbitragem. Todavia, é importante ressaltar que, apesar de as custas iniciais serem altas em comparação com as custas do judiciário, ao final do processo, se levarmos em consideração custas, gastos com advogados, peritos e com diligências incorridas durante todo o processo, fundamentalmente pelas empresas, a arbitragem tende a sair mais em conta. Assim, considerando que a regra no processo do trabalho é a gratuidade aos trabalhadores, uma alternativa para tornar o procedimento financeiramente mais atrativo é a estipulação, na própria cláusula compromissória, de que as despesas, custas administrativas da câmara arbitral e honorários dos árbitros ficarão a cargo do empregador.
Os atrativos do procedimento arbitral são muitos, como a celeridade (um procedimento arbitral costuma durar entre 12 e 18 meses), enquanto que as disputas judiciais, como é de conhecimento notório, costumam se arrastar durante vários anos.
A confiança das partes é o elemento crucial na escolha do árbitro (artigo 13 da Lei de Arbitragem). Num cenário em que o julgador é profissional de confiança das partes e por estas escolhido, como ocorre na arbitragem, as partes tendem a aceitar e a cumprir voluntariamente a sentença arbitral que vier a ser proferida.
Outra vantagem importante é a confidencialidade dos procedimentos arbitrais. Diferentemente dos processos judiciais, em que a publicidade é a regra, nas arbitragens é possível se convencionar confidencialidade. Sendo assim, desde o início do procedimento todos os atos serão sigilosos e assim se manterão até que as partes manifestem vontade contrária. Apesar da não divulgação de nomes na Justiça do Trabalho, é sabido que sites de consulta e publicação de notas de expediente acabam divulgando os dados do processo, o que torna a consulta pública de fácil acesso. Na arbitragem, caso as partes assim acordem, terceiros não terão acesso a qualquer dado do procedimento e sequer terão ciência sobre a existência dele. Dessa forma, a imagem da empresa e do empregado restam completamente protegidas, bem como todas as informações que venham a ser discutidas durante o procedimento, que, em casos envolvendo remuneração expressiva, costumam envolver diversos documentos e comunicações confidenciais.
Por fim, deve-se destacar que, caso o artigo 557-A da Reforma Trabalhista entre em vigor, o que ainda depende de aprovação no Senado e sanção presidencial, os empregados que se encaixarem nos requisitos assinalados continuarão tendo o poder de reivindicar seus direitos no judiciário. A arbitragem é apenas uma alternativa e advém sempre da vontade expressa de ambas as partes.
Os empregados, como cidadãos, assumem os mais diversos compromissos contratuais, exercendo de sua capacidade civil em todos os atos, não sendo razoável a manutenção do monopólio estatal para resolução de toda e qualquer controvérsia decorrente da relação de trabalho. O modelo atual vem demonstrando ser falho, fundamentalmente na garantia de celeridade, com varas e tribunais do trabalho amarrotados de processos aguardando julgamento ou solução definitiva[7]. O mundo moderno exige soluções simples e eficazes, como o procedimento arbitral, sendo esse o principal objetivo do projeto de lei.
[1] Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
§ 1º Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.
[2] Art. 3º. Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada a cessação coletiva do trabalho.
[3]Art. 4º. Caso a negociação visando à participação nos lucros ou resultados da empresa resulte em impasse, as partes poderão utilizar-se dos seguintes mecanismos de solução do litígio:
II – arbitragem de ofertas finais, utilizando-se, no que couber, os termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996.
[4] Art. 37. Deve ser constituída, no âmbito do órgão de gestão de mão de obra, comissão paritária para solucionar litígios decorrentes da aplicação do disposto nos arts. 32, 33 e 35. § 1º Em caso de impasse, as partes devem recorrer à arbitragem de ofertas finais. § 2º Firmado o compromisso arbitral, não será admitida a desistência de qualquer das partes. § 3º Os árbitros devem ser escolhidos de comum acordo entre as partes, e o laudo arbitral proferido para solução da pendência constitui título executivo extrajudicial.
[5] http://www.previdencia.gov.br/2017/01/beneficios-indice-de-reajuste-para-segurados-que-recebem-acima-do-minimo-e-de-658-em-2017/
[6] “Desde que o empregado ocupe ou venha a ocupar cargo ou função de administrador ou de diretor estatutário, nos contratos individuais de trabalho poderá ser pactuada cláusula compromissória, que só terá eficácia se o empregado tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou se concordar expressamente com a sua instituição”.
[7] O tempo médio de tramitação de um Recurso de Revista no TST, conforme dados do ano de 2016 (http://www.tst.jus.br/documents/10157/6e05e69e-0822-48aa-964e-1581411e7523), é de 732 dias, que, somados ao tempo de tramitação em primeira e segunda instância, torna normal um processo trabalhista ter duração superior a 3 anos.
Por Caroline Schaeffer, advogada com atuação em contencioso e arbitragem, integrante do CBAR e da diretoria da Associação Brasileira de Estudantes de Arbitragem (ABEArb). E João Antônio Marimon, advogado trabalhista, integrante de Souto, Correa Advogados em São Paulo.
Fonte: Jota – 28 de Abril de 2017 – 17h35
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Vídeo – A Reforma Trabalhista e a Arbitragem no Contrato de Trabalho

A Reforma Trabalhista e a Arbitragem. Nesta edição, Asdrubal Júnior comenta sobre o texto aprovado na Câmara dos Deputados da Reforma Trabalhista, na parte que contempla a possibilidade de se prever a Cláusula da Arbitragem no Contrato Individual do Trabalho, fazendo a interpretação mais adequada do texto, e analisando também a possibilidade de utilização da Arbitragem trabalhista mesmo nos casos de remuneração inferior ao previsto no texto proposto para criação do art. 507-A na CLT.
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Litigar no processo judicial pode ser mais caro do que na arbitragem

As últimas alterações no processo judicial brasileiro, sobretudo após o primeiro ano de vigência do novo Código de Processo Civil, impõem nova reflexão sobre o custo de se litigar no Brasil.
Assim como em outros países, o legislador brasileiro optou por um novo modelo que cria incentivos econômicos para que as partes resolvam as controvérsias por meio de conciliação, mediação e arbitragem.
Ao estabelecer, por exemplo, que os honorários advocatícios de sucumbência poderão ser cumulativos, optou-se por tornar o contencioso judicial mais oneroso.
Analisando controvérsias de considerável valor envolvido, os honorários sucumbenciais poderão representar indesejável risco financeiro para as partes em litígio. Com isso, advogados e partes cada vez mais devem analisar, sob a perspectiva jurídico-econômica, se realmente devem iniciar um processo judicial.
Na arbitragem, as partes podem convencionar as regras do jogo. Considerando sua origem contratual, as partes podem, até mesmo, optar por expressamente excluírem ou delimitarem valores de condenações à título de honorários sucumbenciais.
Isso não significa que os advogados que atuam em arbitragem sejam mal remunerados. Pelo contrário. A experiência demonstra que, cada vez mais, a área de arbitragem recebe atenção especial das principais bancas do país. Contudo, comumente, os advogados que atuam em arbitragem definem a respectiva remuneração contemplando também percentual de êxito.
Com isso, ganham as partes, pois evitam surpresas e definem o parâmetro da remuneração. E ganham os advogados, pois são adequadamente remunerados pelo importante trabalho realizado.
Cumpre analisar em que medida o processo arbitral pode ser mais econômico do que o processo judicial. Diante do contexto, verifica-se que, em determinadas hipóteses, as custas de um procedimento arbitral podem ser inferiores aos valores dispendidos judicialmente.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais[1] aplicou, recentemente, as disposições do Código de Processo Civil, majorando, em sede de apelação, honorários sucumbenciais para que fossem fixados no patamar de 20{090ae30b5a2de34e6896ba6ffc156d967cd5360bfbe023e73084a754d61d15a5} (vinte por cento). Considerando o valor da causa (R$ 1,3 milhão), os honorários atingiram o patamar de R$ 270 mil.
Utilizando o referido caso como exemplo, um procedimento arbitral com mesmo valor estimado, resultaria em custas de aproximadamente R$ 62 mil, considerando a tabela da Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil (Camarb), e contando com a atuação de árbitro único. Caso as partes optassem pela formação de Tribunal Arbitral, composto por três árbitros, o valor das custas seria de R$ 127 mil.
É de se destacar o posicionamento do referido tribunal em relação a matéria. A decisão parece tecnicamente correta e em plena consonância com o novo sistema processual brasileiro. Portanto, não se trata de crítica à decisão judicial mencionada. Pelo contrário, entende-se que a adequada aplicação do sistema processual brasileiro poderá desencadear em decisões similares.
O atual sistema processual exige dos advogados conhecimento prévio sobre todos os possíveis métodos de solução de disputas, como a conciliação, a mediação, a arbitragem e o processo judicial. O profissional deverá analisar, no momento da celebração do contrato, qual é a melhor solução jurídica e econômica para o cliente.
[1]Processo 1.0024.11.020645-5/003. Relator Des. José Marcos Rodrigues Vieira. Data do julgamento: 15/03/2017.
Por Felipe Moraes, advogado e secretário geral da Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil (Camarb). Mestre em Direito Privado e especialista em Direito Público. Professor da Pos-graduação e do LLM do IBMEC. Treinado em Mediação Empresarial (Business Mediation) pelo CPR Conflict Prevention and Resolution – NY.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 10 de abril de 2017, 6h48
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Oferta unilateral e vinculante de arbitragem pela União em PPI

A Medida Provisória 752/16 estabeleceu diretrizes gerais para a prorrogação e a relicitação dos contratos de parceria firmados nos termos da Lei 13.334/16 (PPI – Programa de Parcerias de Investimentos). A MP trata da arbitragem na hipótese de relicitação, por meio de compromisso arbitral em aditivo específico (artigo 15, inc. III), e nos contratos de parceria em geral, em que a cláusula compromissória pode existir de modo originário ou ser incluída em aditivo (artigo 25). [1]
O artigo 25 estabelece peculiaridades da arbitragem no âmbito do PPI, inclusive quanto a custas, patrimonialidade dos direitos e credenciamento de instituições arbitrais. Diversas questões vêm sendo objeto de discussão. Algumas já foram tratadas nas Emendas 005, 023 e 078 à MP 752/16 e serão objeto de consideração no processo de conversão da MP 752/16 em lei. As emendas propostas exigem que a arbitragem seja de direito e aplique o direito brasileiro (Emenda 005), excluem do caput do artigo 25 da MP 752/16 a aparente exigência de prévio exaurimento da via administrativa (Emenda 023) e preveem a participação da AGU na arbitragem e em eventual transação (Emenda 078).
Alguns pontos positivos da MP são (i) a possibilidade de submissão de conflitos a arbitragem independentemente de cláusula compromissória inserida em contrato; (ii) a exigência legal de que a arbitragem seja institucional; (iii) amplitude da segurança jurídica para o parceiro privado, em vista da maior celeridade do processo arbitral e da expertise dos árbitros; (iv) a predeterminação quanto ao adiantamento das custas e despesas relativas ao procedimento arbitral pelo parceiro privado; e (v) a predeterminação das matérias arbitráveis no âmbito do PPI. [2]
Apesar de a permanência das regras trazidas pela MP 752/16 depender de sua conversão em lei, nada impede que seus termos sejam implementados no período em que a MP produzir efeitos, iniciado na data de sua publicação. É possível que contratos do PPI firmados durante a vigência da MP 752/16 contenham cláusula compromissória, que estas sejam incluídas por aditivos nos contratos já existentes e que sejam firmados compromissos arbitrais em aditivos específicos nos casos de relicitação.
A principal inovação da MP 752/16 é a introdução, no Brasil, de um mecanismo amplamente conhecido na experiência internacional para a proteção de investimentos. No âmbito da Convenção de Washington de 1965, da qual o Brasil não é signatário, e da arbitragem de investimento em geral, um Estado pode oferecer genericamente aos seus investidores estrangeiros a possibilidade de submeter os litígios correspondentes a arbitragem. Essa oferta unilateral que reflete o consentimento do Estado soberano [3] é geralmente formulada por meio de acordos multilaterais, acordos bilaterais [4] ou leis nacionais de proteção de investimento. [5] O investidor, por sua vez, aceita essa oferta e aperfeiçoa o consentimento necessário para a existência de uma convenção de arbitragem por meio de uma ampla variedade de manifestações, inclusive por sua conduta — como a própria solicitação de instauração da arbitragem.[6]
Como esclarece Jeswald Salacuse, as disposições em tratados de investimento (e o mesmo pode ser dito sobre leis de proteção de investimento) não podem ser consideradas por si sós como uma convenção de arbitragem, mas como uma oferta unilateral e irrevogável de arbitragem, passível de aceitação também unilateral pela contraparte: “An investor may accept that offer in different ways, including the submission of a request for arbitration or some other mechanism offered in the treaty. The offer includes the various terms and conditions contained in the applicable investment treaty.
O artigo 25 da MP 752/16 estabeleceu sistema similar a este no direito brasileiro, aplicável indistintamente a partes brasileiras ou estrangeiras, desde que no âmbito material coberto pela própria MP 752/16. A leitura do caput e dos §§ 1º a 3º do artigo 25 leva desde logo a essa conclusão. O caput prevê que determinadas “controvérsias surgidas em decorrência dos contratos de parceria nos setores de que trata esta Medida Provisória (…) podem ser submetidas à arbitragem ou a outros mecanismos de solução de controvérsias”. O âmbito material da MP 752/16 corresponde a certos contratos de concessão e de PPP em que o poder concedente é a União Federal — ainda que atuando por meio de instrumentalidades suas, como autarquias federais. O dispositivo estabelece dois requisitos. Primeiro, a necessidade de decisão definitiva da autoridade competente prévia à arbitragem prevista no caput (ou seja, cabe a arbitragem após encerrada a discussão administrativa). Depois, a arbitragem deve dizer respeito a direitos patrimoniais disponíveis previstos no § 4º: a arbitrabilidade objetiva, para os fins dessa oferta unilateral, é limitada aos direitos patrimoniais disponíveis especificados no dispositivo.[7]
Preenchidas tais condições, o caput do artigo 25 deve ser compreendido como manifestação unilateral e definitiva da União Federal de seu consentimento em submeter o litígio em questão a arbitragem. Essa manifestação, por parte da União Federal, é completa e definitiva, condicionada apenas aos dois requisitos estabelecidos no próprio dispositivo. O que falta para o aperfeiçoamento da convenção de arbitragem é a manifestação da contraparte — concessionário ou parceiro privado, conforme o caso. A situação das outras formas de solução extrajudicial também referidas genericamente no dispositivo é distinta, em face da variedade de suas possíveis manifestações. Mas a sujeição à arbitragem por parte da União Federal é já plenamente eleita e consolidada pela redação do artigo 25. Seu aperfeiçoamento como convenção de arbitragem depende apenas da manifestação de consentimento do concessionário ou parceiro privado.
O consentimento da contraparte privada pode ser manifestado por meio de um aditivo ao contrato que não contenha cláusula arbitral (§ 1º do artigo 25) ou mesmo por outras vias, como a própria solicitação de instauração da arbitragem ou uma declaração unilateral. Havendo a concordância da parte privada com a submissão do litígio à arbitragem, o particular passa a integrar uma convenção de arbitragem ou a ter direito ao seu aperfeiçoamento, conforme o caso. Esse direito pode conduzir diretamente à instauração da arbitragem, inclusive por meio do sistema estabelecido pelos artigos 6º e 7º da Lei 9.307/96 para a instauração da arbitragem diante de controvérsia já existente. Ou pode, se esta for a preferência do particular, assegurar-lhe o direito de exigir a celebração do aditivo referido no artigo 25, § 1º, da MP 752/16 para a inclusão de cláusula arbitral no contrato para a solução de controvérsias futuras. Neste caso, os eventuais impasses existentes na definição das condições do aditivo — por exemplo, quanto à escolha da instituição arbitral — deverão ser resolvidos pelo Judiciário.
Essa compreensão do caput e do § 1º do artigo 25 é confirmada por sua própria redação. Nada no caput induz a conclusão de que a autorização para solução da controvérsia por arbitragem é condicionada ao aditivo previsto no § 1º. Teria sido simples ao legislador estabelecer esta condição, mas não o fez. Por outro lado, embora os dispositivos também nada digam expressamente acerca da necessidade de consentimento do particular interessado, este consentimento é conatural à convenção de arbitragem. Em tese, poderia ser — em casos excepcionais — dispensado por uma previsão expressa e clara de arbitragem obrigatória em setores específicos (o que existe em diversos países e, de certo modo, no Brasil no setor de comercialização de energia elétrica). Mas isso dependeria de previsão explícita e não se extrai nem de modo indireto da redação do artigo 25. A compreensão também é confirmada pela redação dos §§ 2º e 3º do dispositivo em questão. Ambos estabelecem condições da arbitragem (antecipação das despesas, realização no Brasil e em língua portuguesa) de modo categórico, não condicionado ao aperfeiçoamento da convenção de arbitragem.
Porém, a confirmação decisiva desse entendimento deriva da interpretação sistemática do artigo 25 e seu § 1º. A mera previsão de que os litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis podem ser objeto de uma convenção de arbitragem entre a União Federal e seus parceiros privados ou concessionários já consta expressamente da Lei 11.079/04 (Lei de PPPs) e da Lei 8.987/95 (Lei de Concessões) desde, respectivamente, 2004 e 2005. Foi consagrada também, inclusive antes disso, em diversas leis setoriais aplicáveis a tais contratados. E foi expressamente reiterada pela alteração da Lei 9.307/96 introduzida pela Lei 13.129/15. Não se pode supor que o legislador (Poder Executivo), por meio da MP 752/16, tenha apenas repetido aquilo que historicamente já havia sido construído e consagrado pelos diversos diplomas que culminaram na reforma legislativa de 2015.
Ademais, esse entendimento dá sentido à previsão do caput de que a submissão à arbitragem é possível “após decisão definitiva da autoridade competente”. Essa condição tem gerado certa perplexidade. Discute-se se implicaria uma restrição de acesso à jurisdição (é este o enfoque da emenda 23 à MP 752/16) ou qual a conduta impedida pela inexistência de tal decisão: a celebração de uma convenção de arbitragem (compromisso), a própria celebração do aditivo previsto no § 1º ou apenas a instauração efetiva da arbitragem. A interpretação do dispositivo é clara e simples quando se compreende que esta é a condição para a oferta unilateral de arbitragem pela União Federal. O dispositivo estabelece que, havendo já uma decisão administrativa, a questão pode ser levada à arbitragem nos termos do artigo 25; não existindo essa decisão, o regime excepcional do artigo 25 não se aplica. Evidentemente, isso não exclui o regime geral, consagrado inclusive no artigo 1º da Lei 9.307/96.
Ou seja, dentro do âmbito material da MP 752/16 (PPI) e desde que tenha havido decisão definitiva da autoridade competente, a oferta unilateral de arbitragem do artigo 25, caput, torna-se eficaz e pode ser objeto de aceitação (também unilateral) pelo particular interessado. Fora dessas condições, aplica-se o regime geral. Isso explica por que pode existir compromisso arbitral ou cláusula compromissória mesmo fora das condições do caput, aplicando-se o regime geral. Também explica por que é válida e não implica ofensa ao direito de acesso à jurisdição a condição (prévia decisão administrativa) prevista no caput. Trata-se da mínima garantia para a União Federal de que sua oferta unilateral de arbitragem pressuporá a prévia existência de uma decisão administrativa.
A noção de decisão definitiva da autoridade competente também exige pequeno aclaramento. O que se exige, para a aplicação do caput, é apenas que exista alguma decisão administrativa. A matéria não pode jamais ter sido objeto de decisão administrativa e ser inovadoramente resolvida de modo definitivo pelo juízo arbitral. Porém, o seu caráter definitivo não exige que tenha sido proferida pela autoridade mais elevada nem que tenham sido exauridos todos os recursos possíveis. Basta que o particular interessado renuncie à discussão administrativa e, com isso, dê caráter definitivo (na via administrativa) à decisão impugnada. Por outro lado, os prazos estabelecidos na legislação federal de processo administrativo (especialmente na Lei 9.784/99) se aplicam. Uma vez exauridos os prazos para decisão, o silêncio da Administração terá preenchido o requisito da prévia decisão administrativa para o efeito de se tornar eficaz a oferta unilateral de arbitragem contida no caput. Isso não impede que, havendo interesse do particular em provocar uma efetiva decisão administrativa antes de aceitar a oferta unilateral de arbitragem contida no caput, este promova medida judicial destinada a obter tal decisão efetiva (por exemplo, um mandado de segurança contra a omissão administrativa). Essa conduta não implica qualquer renúncia ao direito de oportuna aceitação da oferta de arbitragem, uma vez que diz respeito ao momento anterior (“decisão definitiva da autoridade competente”), estabelecido como condição de eficácia da oferta unilateral de arbitragem pela União Federal.
Pelo exposto, conclui-se que o artigo 25 da MP 752/16 traz uma profunda e importante inovação no sistema jurídico brasileiro relativo à arbitragem envolvendo a Administração Pública. Por meio do dispositivo, a União Federal manifesta de modo unilateral seu consentimento para submissão a arbitragem das controvérsias relativas a contratos abrangidos pelo PPI em que tenha já havido decisão definitiva pela autoridade administrativa competente. A configuração dessa condição pode ser precipitada pela renúncia, pelo particular interessado, à impugnação administrativa de decisão já existente, ainda que em tese passível dessa impugnação. Também pode ser configurada pelos efeitos do silêncio administrativo diante do descumprimento de prazos normativos para decisão, como os da Lei 9.784. Não havendo definição prévia das condições para a realização da arbitragem ofertada unilateralmente pelo caput do artigo 25, aplica-se o regime dos artigos 6º e 7º da Lei 9.307/96, cabendo ao Poder Judiciário suprir os elementos necessários para a instauração da arbitragem que não tenham sido definidos pelas partes.
1 V. artigo de Bruno Renzetti.
2 V. apresentação de Luciana Levy.
3 CIURTIN, Horia. “Paradoxes of (Sovereign) Consent: on the uses and abuses of a noition in international investment Law” in BALTAG, Crina. ICSID Convention After 50 Years: unsettled issues. Kluwer Law International, 2016. pp. 25-74. Veja-se, especialmente, § 2.04(B) (Instruments of Consent: (No) Privity and the Triumph of Unilateralism).
4 BORN, Gary. “Enforcing International Arbitration Agreements” in International Arbitration and Forum Selection Agreements: Drafting and Enforcing, 5th edition. Kluwer Law International, 2016. pp. 121-128.
5 MBENGUE, Makane Moïse. “Consent to Arbitration Through National Investment Legislation” in IISD Investment Treaty News, 19 July 2012. Disponível em: <https://www.iisd.org/itn/2012/07/19/consent-to-arbitration-through-national-investment-legislation/>. Acesso em: 02 mar. 2017.
6 SALACUSE, Jeswald. The Law of Investment Treaties, 2nd edition. Oxford University Press, 2015. pp. 422-423.
7 Veja-se artigo de André Rosilho.
Por Cesar Pereira, doutor e mestre em Direito do Estado (PUC/SP). FCIArb. Sócio de Justen, Pereira, Oliveira & Talamini.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 6 de março de 2017, 7h16
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A possibilidade do financiamento de arbitragem por terceiros

Sem dúvidas o momento mais oportuno para a escolha da arbitragem como método de resolução de conflitos é aquele da celebração do contrato por meio da inserção da cláusula compromissória. Neste lapso, ambas as partes estão confiantes e otimistas no resultado positivo da sua nova parceria e, por consequência natural, elegerão a maneira mais célere e eficiente para solucionar os eventuais conflitos.
A predileção pela arbitragem como forma de resolução de disputas empresariais decorre, em certa medida, dos seguintes fatores: i) os benefícios da arbitragem [1], ii) segurança jurídica decorrente da previsão legal [2] e iii) a qualidade das decisões das Cortes Estatais e sobretudo dos Tribunais Superiores. [3] O resultado é notório, pois verifica-se significativo aumento no número de novos casos e nos valores envolvidos nas disputas. [4]
Uma vez que as partes escolhem a arbitragem como meio de resolução de disputas, todas as questões envolvendo direitos patrimoniais e disponíveis, oriundas daquela relação contratual, serão submetidas à apreciação dos árbitros.
Sempre que a arbitragem é escolhida como o método de solução de controvérsias, o recolhimento de custas será condição para sua instauração. Tanto a Câmara escolhida pelas partes quanto os profissionais que serão indicados como árbitros deverão receber a remuneração pela respectiva atividade (taxas e honorários). Normalmente as custas serão calculadas proporcionalmente ao valor da causa. [5]
Além dessas custas existem outros valores que também devem ser contabilizados quando se trata de procedimento arbitral, contratação de um escritório advocatício e de experts (peritos) por exemplo, que por sua vez demandarão ainda mais recursos das partes.
Visando garantir o prosseguimento da arbitragem e a remuneração dos árbitros durante o procedimento, os Regulamentos das principais Câmaras de Arbitragem, como a Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional –Paris (CCC) [6], Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC) [7] e Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil (Camarb) [8], preveem regras determinando que as custas deverão ser recolhidas no início do procedimento, permanecendo, portanto, caucionadas desde o início da arbitragem.
Considerando que a situação econômica das empresas poderá oscilar durante o cumprimento do contrato, não raras vezes as partes litigantes poderão enfrentar dificuldades financeiras, a ponto de não possuírem recursos suficientes para arcarem com as despesas. Isso, sobretudo no atual cenário econômico, vem se mostrando um empecilho para a instauração de algumas arbitragens.
Indo além, há ocasiões em que o único ativo financeiro que uma empresa possui é justamente uma expectativa de direito oriunda de uma possível demanda a ser proposta contra outrem, a exemplo do caso da empresa canadense Crystallex. [9] Assim, a falta de recursos financeiros de uma das partes, de fato, pode ser um entrave para a instauração do procedimento arbitral, visto que não existe nesta modalidade de jurisdição a assistência judiciária ou “justiça gratuita”. [10]
O fato é que, a despeito dos custos envolvidos, a arbitragem ainda assim se mostra extremamente vantajosa em relação às outras formas de resolução de conflitos. E é justamente neste espírito que, hoje, no mercado existe solução apta a viabilizar, no todo ou em parte, os recursos necessários para a instauração (ou prosseguimento) da arbitragem.
Na origem o TPF é a sigla da expressão em inglês para third-party funding que, no Brasil, é chamado de Financiamento de Arbitragem por Terceiros. O TPF pode ser definido como: a relação na qual um terceiro (financiador profissional) alheio à lide, financia as custas e demais despesas devidas por uma das partes envolvidas na arbitragem em troca de participação em eventual resultado financeiro obtido com o êxito da arbitragem (seja por sentença ou acordo).
Destarte, cumpre esclarecer que este mercado possui portfólio variado de produtos envolvendo o financiamento das arbitragens. Dentre as possibilidades existentes no mercado, o Funder ou Financiador poderá:
i) financiar a integralidade ou parte das custas e despesas necessárias para a instauração da arbitragem (taxas, honorários, experts, peritos, escritório de advocacia, dentre outras), sendo remunerado, tão somente por uma participação em eventual resultado da arbitragem (sentença ou acordo). Nessa modalidade, o Funder somente será remunerado em caso de êxito do financiado, assumindo integralmente o risco pelo recolhimento das custas;
ii) emprestar o valor referente às custas, sendo remunerado por (a) uma taxa de juros previamente estabelecida, independentemente do resultado da arbitragem e, (b) um bônus de sucesso em um eventual acordo ou sentença favorável;
iii) adquirir os créditos decorrentes de sentença ou decisão arbitral, com deságio a ser acordado pelas partes, oferecendo liquidez para o financiado e assumindo os riscos envolvidos na execução da sentença.
Para Nieuwveld e Shannon, existem três principais motivos que possibilitam o crescimento do TPF. O primeiro deles é a política pública do acesso à justiça para aqueles que não possuem recursos financeiros suficientes para arcarem com as despesas da demanda. O segundo fator está atrelado à necessidade de algumas empresas manterem o fluxo de caixa disponível para exercer a atividade empresarial usual. Por fim, o terceiro fator apontado pelas autoras está relacionado ao mercado incerto que incentivou os hegde funds, bancos e várias outras instituições financeiras a buscarem investimentos que não estão diretamente ligados à volatilidade do mercado. [11]
Nesse sentido, o contrato de TPF realizado por uma instituição especializada consegue gerar ganhos para a parte financiada e também para o investidor. Poder-se-ia inclusive fazer a seguinte comparação: o TPF está para as arbitragens assim como o private equity (PE) e o venture capital (VC) [12] estão para as Startups. Assim como o PE e o VC, o TPF não representa apenas o aporte de recursos financeiros, mas sim de um verdadeiro instrumento de auxílio jurídico, legal e operacional para uma parte que deseja ser financiada — sem assumir o controle das decisões decorrentes da legitimidade processual. O TPF buscará minimizar os riscos de seu investimento, contribuindo com o cliente com esforços comuns para se alcançar o êxito na sentença.
Além do auxílio oferecido pelo Fundo, a opção pelo financiamento poderá decorrer de análise jurídico e financeira. Poucos são os CFOs [13] que conhecem essa possibilidade financeira para viabilizar os valores necessários via Funder, liberando o capital próprio para ser alocado em investimentos e operações da própria empresa com rentabilidade superior. Por esse motivo, poderá o departamento jurídico ou o escritório contratado, após análise legal e estratégica, apresentar essa opção aos executivos da empresa.
Diante disso, o Financiamento de Arbitragens por Terceiros pode ser a única forma de viabilizar o acesso à arbitragem para empresas em crise. Ademais, a participação de um Funder ou Financiador poderá contribuir até mesmo para a obtenção do êxito na arbitragem.
1 Os benefícios da arbitragem são, principalmente: i) o sigilo, ii) celeridade iii) escolha da lei a ser aplicada e iv) a especialidade das decisões e a possibilidade de escolha do julgador.
Nesse sentido, ver também: TIMM, Luciano Benetti. Arbitragem nos contratos empresariais, internacionais e governamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009 (p. 23-24) e PINTO, José Emilio Nunes. Arbitragem e o desenvolvimento econômico. Revista de Arbitragem e Mediação. Ano 6, nº 20, p. 66-73 – jan.-mar./2009; (p. 72)
2 Atualização da Lei de Arbitragem com a redação dada pela Lei 13.129 de 2015: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9307.htm .
3 STF. SEC nº 5.206. Relator: Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, julgado em 12/12/2001, DJe 30/04/2004. e STJ , REsp 1302900/MG, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 09/10/2012, DJe 16/10/2012)
4 Arbitragem no Brasil cresce 47{090ae30b5a2de34e6896ba6ffc156d967cd5360bfbe023e73084a754d61d15a5} em quatro anos. Publicado em: 10 abr. 2014 e Soluções em arbitragem crescem 73{090ae30b5a2de34e6896ba6ffc156d967cd5360bfbe023e73084a754d61d15a5} em seis anos, mostra pesquisa. Publicado em: 12 de julho de 2016.
5 Supondo um litígio com valor estimado de R$3.500.000,00 (o que é razoável se tratando de procedimento arbitral), as custas médias relativas a uma demanda arbitral com este valor, considerando um Tribunal Arbitral composto por 3 (três) árbitros, podem variar de R$ 200.000,00 (no caso da CAMARB) até R$ 500.00,00 a depender da Câmara escolhida.
6 Regulamento de Arbitragem da CCI: 36(2) Logo que possível, a Corte estabelecerá o valor da provisão que seja suficiente para cobrir os honorários e despesas dos árbitros e as despesas administrativas da CCI relativos às demandas que lhe tenham sido submetidas pelas partes, salvo demandas submetidas nos termos do artigo 7° ou 8°, casos em que o artigo 36(4) será aplicado. A provisão para os custos de arbitragem fixada pela Corte nos termos do artigo 36(2) deverá ser paga pelo requerente e pelo requerido em parcelas iguais.
7 Regulamento de Arbitragem CAM-CCBC: “12.2. A Taxa de Administração devida ao CAM-CCBC será exigida da parte requerente, a partir da data de protocolo da notificação ao Presidente requerendo a instituição da arbitragem, e da parte requerida, a partir da data de sua notificação.
12.7. Cada parte depositará no CAM-CCBC sua quota parte do valor dos honorários dos árbitros, correspondentes a um mínimo de horas definido na Tabela de Despesas ou a um percentual sobre o valor da causa. O referido depósito deverá ser realizado no prazo definido na Tabela de Despesas.
8 Regulamento de Arbitragem da CAMARB: 11.6 No ato de celebração do Termo de Arbitragem, o(s) requerente(s) depositará(ão) metade do total da taxa de administração e dos honorários de árbitros, enquanto o(s) requerido(s) depositará(ão) a outra metade, segundo os critérios definidos neste Regulamento, salvo decisão diversa do Tribunal Arbitral.
9 Relata Duarte Henriques: “A empresa canadiana Crystallex havia sido expropriada da sua unidade de exploração mineira na República Bolivariana da Venezuela, tendo por isso iniciado uma arbitragem no Centro Internacional para a Resolução de Diferendos Relativos a Investimentos – ICSID (vulgarmente denominada ‘arbitragem de investimento’ ou ‘arbitragem ICSID’). Posteriormente, a Crystallex procurou obter financiamento por meio da emissão de títulos de dívida no montante de USD 120 milhões destinados ao pagamento a credores e a fazer face às despesas do processo da arbitragem de investimento. Não tendo obtido sucesso nessa operação, a empresa entrou em processo de insolvência e solicitou ao tribunal canadiano que concedesse autorização para obter financiamento alternativo, para ambas as finalidades apontadas. Foi então autorizada a realização de uma operação de financiamento que envolvia a injecção de capital na empresa dirigida a pagamento de credores, desenvolvimento das operações da empresa e promoção da arbitragem de investimento. Neste financiamento, a entidade financiadora (“Tenor Capital”), além de obter diversas garantias para pagamento dos seus créditos, nomeou também dois dos cinco membros do conselho de administração da empresa supervisionada. A particularidade deste financiamento reside na circunstância de uma parcela do financiamento ser objeto de liquidação em termos similares aos financiamentos obtidos nos mercados financeiros (liquidação de capital e juros) e a outra estar submetida ao regime puro do ‘third-party funding’, ou seja, está submetida ao risco associado ao resultado do processo. ” (HENRIQUES, 2015, p. 579) HENRIQUES, Duarte Gorjão. “Third Party Funding” ou o Financiamento de Litígios por terceiros em Portugal. Revista da Ordem dos Advogados de Portugal. Lisboa, ano 75, n. 3-4, p. 573-624, jul-dez 2015;
10 Nesse sentido, Ferro, Marcelo Roberto. O Financiamento de arbitragens por terceiro e a independência do árbitro, in CASTRO, Rodrigo R. de Monteiro et al., Direito empresarial e outros estudos de direito em homenagem ao Professor José Alexandre Tavares Guerreiro. São Paulo: Quartier Latin, 2013, p. 626.
11 Nieuwvald, Lisa Bench e Shannon, Victoria. Third-party Funding in International Arbitration. Alphen Aan Den Rijn: Kluwer Law International, 2012, p. 11.
12 “Uma primeira característica dos investimentos PE/VC é o papel ativo do gestor do fundo em identificar uma companhia com potencial para ser investida, negociar e estruturar a transação, intervir na gestão da companhia e monitorar o portfólio de companhias após a realização dos investimentos. Assim, um investimento PE/VC é consideravelmente diferente de uma seleção passiva de ativos, com a mera compra e retenção dos papéis, sem maiores interações com a companhia investida, como pode acontecer com outras modalidades de investidores. ” (LOBO; PONTENZA, 2016, p. 268) LOBO, Carlos Alexandre; PONTENZA, Guilherme Peres. Investimentos venture capital e private equity: considerações práticas e jurídicas. In: BOTREL, Sérgio; BARBOSA, Henrique (coord.). Finanças corporativas: aspectos jurídicos e estratégicos. 1. Ed. – São Paulo: Atlas, 2016.
13 Chief Financial Officer.
Por Felipe Moraes, advogado e secretário geral da Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil (Camarb). Mestre em Direito Privado e especialista em Direito Público. Professor da Pos-graduação e do LLM do IBMEC. Treinado em Mediação Empresarial (Business Mediation) pelo CPR Conflict Prevention and Resolution – NY. E Heitor Castro Cunha, Secretário de Procedimento na Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil (Camarb).
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 2 de março de 2017, 7h27
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Arbitragem, Tribunal de Contas e Direito Marítimo e Portuário – III

Recentemente, foi elaborado breve artigo pela Corte de Contas do Estado de São Paulo, de autoria de Sergio Siqueira Rossi, sobre a utilização da arbitragem pela Administração Pública. Dos pontos suscitados, um chama atenção pela sua contundência e pela possibilidade de equívocos interpretativos se analisado de forma desatenta. Em suma, o autor afirma ser “de fundamental importância que as Cortes de Contas atentem para a adequação da opção pela arbitragem e de seu processamento, de modo a coibir práticas que, ao final, mostrem-se danosas ao Erário, e, via de consequência, não preservem o interesse público“.
A problemática levantada demonstra certo receio de um Tribunal Arbitral se imiscuir em questões de ordem financeira e sobre a correta e eficiente destinação de receitas, ou criação de despesas. Todavia, não foi essa a intenção da reforma legislativa que incluiu a possibilidade de a Administração Pública utilizar a arbitragem como meio de resolução de conflito, haja vista ela poder ser a ferramenta mais adequada e condizente de acordo com a complexidade do caso.
O teor do artigo, não obstante a nobre intenção do autor em defender o erário público e o interesse público, é temerário em razão de sugerir que o Tribunal de Contas possa realizar o controle do que é decidido pela jurisdição arbitral. Contudo, não é dessa forma que a preocupação do autor Siqueira deve ser interpretada.
A uma, assim como há independência entre Cortes de Justiça (Poder Judiciário) e Cortes de Contas, há também independência entre Jurisdição arbitral e Tribunais de Contas, pois nem um nem outro pode se imiscuir no mérito do que cada Corte decide.
A duas, o julgamento das Cortes de Contas não se confunde com o realizado pelo Tribunal Arbitral, o qual profere julgamento equiparado, como bem dito por Siqueira, à decisão de natureza judicial. Isso por uma razão simples: a arbitragem substitui a jurisdição estatal no momento em que existir, concomitantemente, (i) anuência das partes para (ii) resolução de conflito de direito patrimonial disponível.
A função do Tribunal de Contas, como estipulado pelo caput do art. 70, da CF, é de realizar a “fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas“. Ou seja, o conteúdo de seu julgamento é eminentemente técnico e especificamente sobre matérias de cunho orçamentário, financeiro e contábil das contas da Administração Pública.
Trata-se, portanto, de análise de compatibilidade entre destinação e criação de receitas e despesas com o orçamento público, com aquilo que foi permitido gastar. O julgamento com critérios de economicidade, no qual se inclui a apreciação da eficiência dos gastos públicos, também é feito para verificar se esses valores públicos foram bem gastos. Na hipótese de não ser, a Corte de Contas pode julgar irregular o ato, mas nunca apurar a conduta em si que ensejou as perdas, haja vista isso ser atribuição das Cortes de Justiça.
Nesse sentido, o receio mencionado pelo autor do artigo diz respeito aos possíveis reflexos da decisão arbitral em questão que envolva gastos públicos, como, por exemplo, temas atinentes a reequilíbrio econômico-financeiro de contratos administrativos, matérias passíveis de serem arbitráveis (direito patrimonial disponível).
Esses reajustes, havendo controvérsias, podem ser averiguados tanto pelo Judiciário como pela Arbitragem. Em ambos os casos o Tribunal de Contas pode apreciar seus reflexos na economicidade do cumprimento do contrato, mas nunca adentrar o mérito da decisão. O simples fato de ele zelar pela probidade e higidez do erário público não o autoriza a realizar controle de legalidade ou de mérito do que foi decidido por decisão judicial ou arbitral.
Em síntese, o controle a ser feito pelas Cortes de Contas restringe-se ao de legalidade, legitimidade e economicidade dos gastos públicos. O que for decidido pela via arbitral, repercuta ou não nas coisas públicas, sequer pode ser controlado pela jurisdição estatal, sendo essa lógica também aplicada ao Tribunal de Contas.
Por João Paulo Hecker da Silva, sócio do escritório Lucon Advogados.
Fonte: Migalhas – quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017
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