Como fruto do princípio competência-competência, aplicável aos procedimentos de arbitragem, o tribunal arbitral possui preferência lógico-temporal em relação ao Poder Judiciário para a interpretação dos limites e do alcance do compromisso arbitral. Nesses casos, ao Judiciário é reservada a manifestação apenas quando forem detectadas cláusulas arbitrais consideradas “patológicas”, que possam gerar a nulidade do compromisso em parte ou no todo.
O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao manter acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que reconheceu a existência de cláusula compromissória e a precedência cronológica do tribunal arbitral para se manifestar quanto à sua própria competência.
Ao acolher o agravo de uma das empresas integrantes do processo, o TJRJ citou precedentes no STJ no sentido da hierarquia cronológica entre o árbitro e o juiz togado, com a consequente atribuição ao árbitro para decidir, em primeiro lugar, a respeito de sua competência para conhecer de determinada controvérsia.
Por meio de recurso especial, a outra empresa envolvida no litígio alegou que as partes não firmaram convenção arbitral para dirimir questões sobre o ponto principal trazido ao processo – o pagamento de prêmio em contrato de aquisição de um prédio –, de forma que não poderia ser retirado do Judiciário o poder de decidir sobre o tema.
Precedência
A ministra Nancy Andrighi, relatora, afirmou que, como efeito do princípio competência-competência, previsto no artigo 8º da Lei 9.307/1996, a legislação brasileira estabelece uma precedência temporal ao procedimento arbitral, permitindo que os processos sejam levados ao Judiciário somente após a edição de sentença arbitral.
No caso dos autos, a relatora destacou que a empresa recorrente aponta que as questões relativas ao prêmio não seriam arbitráveis, por ausência de previsão no contrato de arbitragem. Todavia, Nancy Andrighi lembrou que o TJRJ sinalizou que uma das cláusulas do contrato arbitral prevê a não incidência do compromisso em relação ao pagamento de “preço”, não de “prêmio”. Em virtude dessa dubiedade, a corte fluminense entendeu que caberia ao tribunal arbitral resolver tais ambiguidades e fixar a extensão de sua competência.
“Ressalte-se que a fixação do alcance da cláusula compromissória está incluída no princípio competência-competência, devendo ser conferida preferência lógico-temporal ao tribunal arbitral para a interpretação quanto aos legítimos limites do compromisso arbitral”, disse a ministra.
Segundo Nancy Andrighi, o STJ tem admitido afastar a regra da competência-competência somente em situações muito extremas, como nos casos de detecção de cláusulas “patológicas” – por exemplo, diante de ilegalidade do compromisso arbitral.
“Nesse contexto, o princípio competência-competência é um mecanismo para garantir os plenos efeitos à cláusula compromissória. Isso somente poderá ser alcançado se o tribunal arbitral se manifestar acerca do litígio que lhe for submetido”, concluiu a ministra ao manter o acórdão do TJRJ.
A 3ª turma do STJ negou provimento a recurso que contestava procedimento arbitral instaurado para dirimir controvérsia originada de contrato de promessa de compra e venda de unidade de empreendimento imobiliário (contrato de adesão) em que os consumidores, em momento posterior, assinaram o termo de arbitragem para a solução da controvérsia extrajudicial.
A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, anotou no voto que o art. 51 do CDC se limita a vedar a adoção prévia e compulsória da arbitragem no momento da celebração do contrato, mas impele que, havendo o consenso entre as partes, o procedimento arbitral seja instaurado.
“É possível a utilização da arbitragem para a resolução de conflitos originados de relação de consumo quando não houver imposição, pelo fornecedor, bem como quando a iniciativa da instauração ocorrer pelo consumidor; ou no caso, de iniciativa do fornecedor venha a concordar e ratificar expressamente, com a instituição.”
Conforme o voto da ministra, na hipótese, os consumidores celebraram de forma autônoma em relação ao contrato de aquisição de imóvel um termo de compromisso e participaram ativamente do procedimento arbitral: “Os supostos fatos novos deduzidos pela recorrente no curso da arbitragem não permitem que se afaste a jurisdição arbitral.”
Recentemente, em São Paulo, durante o 5º Fórum de reestruturação de empresas: novas estratégias e desafios, juristas e empresários discutiram as melhores soluções e caminhos possíveis para reestruturar algumas empresas atingidas pela crise que assolou inúmeros segmentos da economia brasileira.
Casos atuais como a recuperação judicial do aeroporto de Viracopos e a recuperação extrajudicial da Triunfo Participações e Investimentos foram apresentados e questões teóricas e práticas envolvendo a Lei de Recuperação e Falência foram debatidas.
Dentre os vários temas tratados, uma preocupação pareceu ser comum: a importância da equivalência de esforços de todos os personagens para o soerguimento da empresa e a relevância de se negociar com boa-fé e transparência.
Para sair da crise, se reinventar, é fundamental que a empresa devedora, seus acionistas ou sócios, e os credores, dentre eles fornecedores e instituições financeiras, deem a sua contribuição, sua cota de esforço pelo bem comum. Afinal, em um processo de reestruturação ou recuperação, todos devem ceder para que a empresa continue cumprindo sua função social, gerando empregos, recolhendo tributos e fomentando a economia.
Abra-se um parêntese para ressaltar que se a empresa não tem condições de cumprir essa função, é desejável que sua quebra seja decretada o quanto antes para oxigenar o mercado, renovar o ciclo e abrir espaço para novas empresas produzirem, empregarem e pagarem tributos, aquecendo a economia.
Nesse contexto, dominar técnicas de negociação e buscar métodos alternativos de solução de controvérsias, como a mediação, podem ser medidas extremamente úteis para a empresa em crise. Lembre-se que as relações com fornecedores e bancos geralmente são duradouras e permanecerão após a crise. Nada melhor, então, do que preservar esses laços em prol da relação negocial que será mantida. Uma negociação pouco transparente, pouco cordial, ou até agressiva pode resolver o problema imediato, mas minar uma relação futura.
Desde a entrada em vigor em 2015 da Lei de Mediação (Lei 13.140) e do atual CPC (Lei 13.105), a mediação ganhou força no Brasil. Em 2016, na I Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios, coordenada por um dos grandes entusiastas dos meios consensuais de solução de conflitos, ministro Luis Felipe Salomão, foi aprovado o enunciado 45 que deixa clara a compatibilidade da mediação com os processos de insolvência.
E o que se observa, nos últimos anos, é o uso crescente da mediação em recuperações judiciais. Citem-se, como exemplo, as RJs do Grupo Oi (7ª Vara Empresarial – VE/RJ), Grupo Isolux (1ª Vara de Falência e Recuperações/SP), Sete Brasil (3ªVE/RJ), Superpesa (6ª VE/RJ) e Livrarias Saraiva e Siciliano (2ª Vara de Falência e Recuperações/SP).
O Poder Judiciário, portanto, tem cumprido seu papel de incentivador e apoiador dessa importante e inovadora ferramenta de solução de controvérsias. Cabe agora aos empresários e seus consultores jurídicos e financeiros, contratados para auxiliar na reestruturação da dívida (momento anterior à eventual decisão de ingressar com a recuperação judicial), fazerem melhor uso da mediação. Contar com profissionais qualificados, experientes em negociação, certamente vai contribuir para uma boa solução dos conflitos e manutenção das relações negociais.
Esse contato prévio da devedora com seus principais credores em um ambiente neutro, seguro e propenso ao acordo será útil, inclusive, se a empresa decidir pelo uso da recuperação judicial, pois permitirá, dentre outros benefícios, que o plano de recuperação judicial (PRJ) esteja o mais alinhado possível com os credores que, ao final, têm o poder de aprová-lo ou não na Assembleia Geral de Credores. A negociação e o diálogo são a base de todo o processo coletivo de recuperação judicial, no qual, como dito, todos têm que ceder.
Por Samantha Mendes Longo, sócia de Wald, Antunes, Vita, Longo e Blattner Advogados; Membro do grupo de recuperação judicial criado pelo CNJ; Secretária-Adjunta da Comissão de Recuperação Judicial e da Comissão de Mediação, ambas da OAB; conselheira e presidente da Comissão de Relação com o Poder Judiciário da OAB/RJ. Professora da EMERJ e ESAJ.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 13 de junho de 2019, 9h49
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Respeitadas as diferenças e peculiaridades da jurisdição estatal e das cortes arbitrais, é possível aplicar as normas de penhora no rosto dos autos aos procedimentos de arbitragem, de forma que o magistrado possa oficiar ao árbitro para que este indique em sua decisão, caso seja favorável ao executado, a existência da ordem judicial de constrição.
A possibilidade desse tipo de penhora foi reconhecida pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Todavia, o colegiado apontou que a ordem de penhora só deve ser efetivada na fase de cumprimento da sentença arbitral, preservando-se a confidencialidade prevista para os processos arbitrais.
“Tal proposição, vale ressaltar, se justifica naquele ideal de convivência harmônica das duas jurisdições, sustentado pela necessidade de uma atuação colaborativa entre os juízos e voltado à efetiva pacificação social, com a satisfação do direito material objeto do litígio”, disse a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi.
Prevista pelo artigo 860 do Código de Processo Civil de 2015 (e, antes, pelo artigo 674 do CPC de 1973), a penhora no rosto dos autos é a penhora de bens que poderão ser atribuídos ao executado em outro processo no qual ele seja autor ou no qual tenha a expectativa de receber algo de valor econômico.
Execução milionária
A ação de execução de título extrajudicial que originou o recurso teve como base 63 cédulas de crédito bancário, no valor total de mais de R$ 247 milhões. Em decisão interlocutória, o juiz decretou a penhora de direitos, bens e valores – atuais e futuros –, em razão de procedimento arbitral em trâmite no Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
No recurso especial dirigido ao STJ, a parte devedora alegou que a penhora no rosto dos autos só seria cabível quando o direito estivesse sendo pleiteado no âmbito judicial. Segundo o recorrente, além de o procedimento de arbitragem ser confidencial, a penhora sobre direitos advindos da arbitragem não teria previsão expressa do CPC/1973.
Constrição futura
A ministra Nancy Andrighi explicou que a penhora no rosto dos autos consiste apenas em uma averbação com o objetivo de resguardar interesse de terceiro. Por meio da averbação, o interessado fica autorizado a promover, em momento futuro, a efetiva constrição de valores ou bens que lhe caibam, até o limite devido.
“Ao contrário do que sustenta o recorrente, não é condição para a penhora no rosto dos autos que a medida só possa ser requerida quando já instaurada a fase de cumprimento de sentença, razão pela qual o fato de o procedimento de arbitragem estar ‘em curso’, por si só, não prejudica a pretensão da recorrida”, afirmou a ministra.
Segundo a relatora, apesar das recentes alterações legislativas que fortaleceram os procedimentos de arbitragem – como a Lei 13.129/2015 –, o árbitro não foi investido de poder coercitivo direto, de modo que, diferentemente do juiz, ele não pode impor restrições ao patrimônio do devedor contra a sua vontade.
No caso dos autos, Nancy Andrighi destacou que o deferimento da penhora não implica a apreensão efetiva dos bens, mas “a mera afetação do direito litigioso”, a fim de possibilitar a futura expropriação do patrimônio que eventualmente venha a ser atribuído ao executado na arbitragem, além de criar a preferência para o exequente.
“Cabe salientar que, entre as mencionadas peculiaridades, está a preservação da confidencialidade estipulada na arbitragem a que alude a recorrente e da qual não descurou a Lei 9.307/1996, ao prever, no parágrafo único do artigo 22-C, que o juízo estatal observará, nessas circunstâncias, o segredo de Justiça” – concluiu a ministra ao manter a penhora.
O Brasil, desde a edição da lei 9.307/96, adotou um sistema de arbitragem caracterizado como monista1. A referida lei estabelece o que seria uma arbitragem no âmbito doméstico, mas não tece qualquer comentário acerca da arbitragem internacional.
Com efeito, quando do advento da lei 9.307/1996, notou-se a despreocupação do legislador brasileiro em fixar uma regra própria para caracterizar a arbitragem internacional. O sistema monista, adotado pelo legislador brasileiro, levou em conta apenas o que se pode chamar de internacionalidade da sentença arbitral. Portanto, adotou-se a fórmula preconizada pelo art. 34, parágrafo único, da Lei n.º 9.307/1996, segundo a qual “considera-se sentença arbitral estrangeira a que tenha sido proferida fora do território nacional“.
Isso implica afirmar que, quando proferida fora do território nacional, a sentença arbitral adquire caráter de sentença estrangeira. Pouco importa se as partes possuíam a mesma nacionalidade e que o procedimento arbitral tenha ocorrido em solo brasileiro. Sendo a sentença proferida e assinada em território estrangeiro, mesmo tendo o processo arbitral sido desenvolvido no Brasil, para fins legais, a sentença será sempre considerada estrangeira. A sentença arbitral, contudo, não será reputada estrangeira, se proferida em território brasileiro, ainda que por intermédio de uma instituição que não possua sede no Brasil (CCI, por exemplo), o que, aliás, já foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (“STJ”)2.
Ainda que em forma de tentativa, é de grande importância detectar quando uma arbitragem é internacional e, para tanto, o direito comparado é uma eficaz ferramenta para a análise da internacionalidade da arbitragem. Isso implica afirmar que, um breve estudo comparativo de diversas legislações estrangeiras, revela-se extremamente útil de modo a demonstrar a verdadeira essência da internacionalidade da arbitragem
Com efeito, não são poucas as legislações sobre arbitragem que adotam diferentes critérios no que tange ao conceito da internacionalidade da arbitragem. Entre esses critérios, citam-se o geográfico, o econômico e o jurídico.
Segundo o geográfico, a arbitragem é internacional quando possui contatos objetivos com mais de um ordenamento jurídico. Trata-se de critério seguido, por exemplo, no direito suíço, que determina que há arbitragem internacional se o tribunal arbitral tiver a sua sede na Suíça e se pelo menos uma das partes não tiver o seu domicílio ou residência habitual na Suíça. Portanto, dispõe o art. 176 da LDIP suíça: “[a]s disposições do presente capítulo se aplicam a toda arbitragem se a sede do tribunal arbitral se encontra na Suíça e ao menos uma das partes não possuía, no momento da conclusão da convenção de arbitragem, seu domicílio ou sua residência habitual na Suíça“3.
Além do critério geográfico para definição de arbitragem internacional, existe o chamado critério econômico, também denominado de “objetivo”, adotado, por exemplo, pelo direito francês que, ao editar a sua nova legislação sobre arbitragem, fez constar no art. 1.504 do Nouveau Code de Procédure Civile a determinação segundo a qual é internacional a arbitragem quando esta coloca em jogo os interesses do comércio internacional4. No mesmo sentido, é a disposição contida no art. 49. Item 1, da Lei Portuguesa de Arbitragem: “Entende-se por arbitragem internacional a que põe em jogo interesses do comércio internacional”5.
Philippe Fouchard, grande defensor do critério econômico para a caracterização da internacionalidade da arbitragem, explica que a arbitragem é feita para o litígio, e não o litígio que é feito para a arbitragem, de modo que a internacionalidade da arbitragem deve ser definida pela substância da relação jurídica6.
Finalmente, um dos critérios utilizados para a caracterização da internacionalidade da arbitragem é o que diz respeito à internacionalidade da relação jurídica. Esse critério é fundado em pura lição de direito internacional privado: sendo internacional o contrato que contenha a convenção de arbitragem, necessariamente o procedimento arbitral será internacional.
O critério da internacionalidade da relação jurídica vem sendo adotado no direito brasileiro, o que se pôde verificar por meio de recentes julgados. Ao invés de utilizar o critério geográfico ou o econômico7, de modo a detectar a internacionalidade da arbitragem, a jurisprudência do STJ manifestou-se recentemente pela aplicação do critério da internacionalidade da relação jurídica. Determinados trechos da referida decisão merecem ser citados8:
“(…)Verifica-se que o contrato de representação comercial em exame foi celebrado na Alemanha, por uma empresa brasileira e outra alemã, e estabeleceu cláusula arbitral convencionando que eventuais conflitos deveriam ser dirimidos pelo Direito alemão, por árbitros da Câmara de Comércio Internacional de Paris. Trata-se, portanto, de contrato internacional, com características que não correspondem exatamente às dos contratos internos, firmados para produzir efeitos integralmente dentro do país. […]. Nos contratos internacionais, ganha relevo a aplicação dos princípios gerais de direito internacional em detrimento da normatização específica de cada país, o que justifica, na espécie em exame, a análise da cláusula arbitral convencionada entre as partes sob a ótica do Protocolo de Genebra de 1923”
Por que não reunir ambos os critérios para fins de construção legislativa, enfatizando o que realmente é arbitragem internacional?
Foi nesse sentido que, incorporando os critérios geográficos e econômicos, a lei espanhola de arbitragem, editada no ano de 2003 e revista em 2011, em uma clara noção e aplicação de puro direito comparado – pois investigou em outras legislações tais critérios –, adotou, em seu art. 3.º, a seguinte disposição9:
Artículo 3. Arbitraje internacional.
El arbitraje tendrá carácter internacional cuando en él concurra alguna de las siguientes circunstancias:
a) Que, en el momento de celebración del convenio arbitral, las partes tengan sus domicilios en Estados diferentes.
b) Que el lugar del arbitraje, determinado en el convenio arbitral o con arreglo a éste, el lugar de cumplimiento de una parte sustancial de las obligaciones de la relación jurídica de la que dimane la controversia o el lugar con el que ésta tenga una relación más estrecha, esté situado fuera del Estado en que las partes tengan sus domicilios.
c) Que la relación jurídica de la que dimane la controversia afecte a intereses del comercio internacional.
A los efectos de lo dispuesto en el apartado anterior, si alguna de las partes tiene más de un domicilio, se estará al que guarde una relación más estrecha con el convenio arbitral; y si una parte no tiene ningún domicilio, se estará a su residencia habitual.
A junção dos fatores geográficos e econômicos10 realizada pela moderna lei espanhola de arbitragem, faz com que essa legislação seja a que, na atualidade, melhor atenda aos interesses dos operadores da arbitragem internacional. Não pairam dúvidas quanto à internacionalidade da arbitragem, tornando mais fácil a tomada de decisões pelos tribunais, em razão do próprio quesito “internacionalidade”.
Por mais louváveis que sejam os critérios acima colocados para definição da internacionalidade, sendo todos perfeitamente cabíveis para detectar o caráter internacional de um litígio, o que se deseja é que tais critérios estejam contemplados em um só ordenamento. Assim, quaisquer dúvidas acerca da internacionalidade cessariam de vez.
O caminho atualmente seguido pelo direito brasileiro – utilização do critério da internacionalidade da relação jurídica – é bastante útil para detectar a internacionalidade de um procedimento arbitral, o que é importante para a resolução de questões que impliquem conflito de leis.
Contudo, para que o Brasil siga na rota da modernidade, há de tomar como modelo o exemplo da lei espanhola, preenchendo lacunas jurídicas por meio do direito comparado11, o que certamente trará benefícios a advogados, juízes e árbitros, atuantes na seara da arbitragem doméstica e internacional.
__________
1 DIAS, Aline Henriques. Os Sistemas Monista e Dualista na Arbitragem Comercial. Revista Brasileira de Arbitragem (Comitê Brasileiro de Arbitragem-CBAr & IOB. Kluwer Law International, 2016, Vol. XIII, Issue 50, pp. 92-111.
2 Algumas passagens da ementa desta decisão merecem ser transcritas: “A determinação da internacionalidade ou não de sentença arbitral, para fins de reconhecimento, ficou ao alvedrio das legislações nacionais, conforme o disposto no art. 1º da Convenção de Nova Iorque (1958), promulgada pelo Brasil, por meio do decreto 4.311/02, razão pela qual se vislumbra no cenário internacional diferentes regulamentações jurídicas acerca do conceito de sentença arbitral estrangeira […] No ordenamento jurídico pátrio, elegeu-se o critério geográfico (ius solis) para determinação da nacionalidade das sentenças arbitrais, baseando-se exclusivamente no local onde a decisão for proferida (art. 34, parágrafo único, da Lei nº 9.307/96) […] Na espécie, o fato de o requerimento para instauração do procedimento arbitral ter sido apresentado à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional não tem o condão de alterar a nacionalidade dessa sentença, que permanece brasileira”. STJ, REsp n.º 1231554/RJ, Terceira Turma, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 24.05.2011, DJ 01.06.2011.
3 Loi Fédérale du 18 décembre 1987 sur le droit international privé (LDIP). No mesmo sentido dispõe a art. 1.º, item 3, da Lei Modelo da UNCITRAL sobre arbitragem comercial internacional do ano de 1985 (com as emendas adotadas no ano de 2006). Tradução livre.
4 Art. 1.504 do NCPC francês: “Est international l’arbitrage qui met en cause des intérêts du commerce international”.
5 Lei 63/2011, de 14 de dezembro (versão atualizada). Para Dario Moura Vicente, o critério econômico de internacionalidade ostenta a vantagem de abranger “certos negócios que apresentam conexões com um só País, mas que, todavia, se encontram intrinsecamente ligados a uma operação econômica internacional”. VICENTE, Dario Moura. Da Arbitragem Comercial Internacional: direito aplicável ao mérito da causa. Coimbra: Coimbra Editora, 1990, p. 40.
6 FOUCHARD, Philippe. Quand un arbitrage est-il international?. Phlippe Fouchard: Écrits – Droit de l’arbitrage e droit du commerce international. Paris: Comitê français de l’arbitrage, 2007. p. 261.
7 Em um caso isolado, entretanto, o Supremo Tribunal Federal admitiu a internacionalidade da arbitragem pelo seu critério econômico: “Não são fatores geográficos ou relativos ao domicílio das partes que o caracterizam como contrato internacional, em oposição aos contratos internos, mas, sobretudo, a finalidade do contrato, ou seja, o transporte marítimo de país a país, portanto transnacional, atividade econômica de apoio, principalmente, aos contratos de compra e venda entre pessoas de nacionalidades diversas, sujeitas a sistemas jurídicos diferentes, que acabam por vincular-se pela vontade das partes” (STJ, 3.ª Turma, REsp n.º 616/RJ, rel. Min. Cláudio Santos, j. 24.04.1990, RSTJ 37/263).
8 Nesse sentido, v. STJ, 3.ª Turma, REsp n.º 712566/RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 18.08.2005, DJ 05.09.2005, p. 407.
9 Lei 60, de 23.12.2003. Texto integral. Acesso em 26.06.2019.
10 Segundo Fernando Mantilla-Serrano, os critérios para definir a internacionalidade da arbitragem na nova lei espanhola “são os mesmos recomendados pela Lei Modelo UNCITRAL. Adiciona-se ainda um critério de inspiração francesa, segundo a qual é internacional a arbitragem quando a relação jurídica básica – e não a controvérsia ela mesma – ‘afeta os interesses do comércio internacional’ – cf. art. 3.1c” (A nova Lei de Arbitragem na Espanha. Revista Brasileira de Arbitragem, São Paulo: Thomson-IOB, n. 2, p. 113, abr.-jun. 2004).
11 Como ponderou Leontin-Jean Constantinesco, “no curso do tempo, os juristas se tornam cada vez mais conscientes do fato de que as experiências dos outros povos constituem uma reserva indispensável para qualquer reforma jurídica válida”. CONSTANTINESCO, Leontin-Jean. Tratado de direito comparado: introdução ao direito comparado. Edição brasileira organizada por Maria Cristina De Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 152.
Por Thiago Marinho Nunes, doutor em Direito Internacional e Comparado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Mestre em Contencioso, Arbitragem e Modos Alternativos de Resolução de Conflitos pela Universidade de Paris II – Panthéon-Assas. Vice-presidente da CAMARB; professor do Núcleo de Pesquisa em Arbitragem do IBMEC-SP; árbitro independente.
Fonte: Migalhas, terça-feira, 28 de maio de 2019
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A sub-rogação dos direitos de seguradoras deve obedecer aos limites dos direitos dos segurados. Foi o que definiu nesta quarta-feira (15/5) a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, ao homologar sentença arbitral da Câmara Internacional de Comércio, de Nova York.
O tribunal entendeu que, se o contrato de fornecimento previa a solução de litígios por meio de arbitragem, a seguradora não pode ir à Justiça cobrar o mesmo direito. Portanto, deve se submeter à decisão arbitral.
A discussão foi levada à Justiça porque, para valer no Brasil, sentenças estrangeiras precisam ser homologadas pelo STJ. Na Corte Especial, prevaleceu o entendimento do relator, ministro Og Fernandes. Para ele, a Mitsui está vinculada à cláusula arbitral, em razão da sub-rogação nos direitos e ações da Alunorte.
“O segurador, quando entra num contrato formado, tem que respeitá-lo e não pode ter outro. Não pode ir à Justiça”, disse o relator. O ministro foi seguido pela maioria da Corte Especial. A decisão foi tomada nesta quarta depois de leitura de voto-vista da ministra Nancy Andrighi, que acompanhou Og. Ficaram vencidos os ministros João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão e Benedito Gonçalves.
No caso, o colegiado analisou um pedido formulado pela Alstom Brasil contra a seguradora Mitsui. A Alstom fez um contrato com a Alunorte para fornecimento de uma caldeira industrial. No contrato, previu-se que qualquer litígio dele decorrente seria resolvido por arbitragem.
Depois disso, a Alunorte contratou um seguro para a caldeira com a Mitsui. Quando a caldeira quebrou, a Alunorte acionou o seguro. A Mitstui, por entender que a quebra aconteceu por mau uso, decidiu cobrar o prejuízo da Alstom, mas disse não concordar com a cláusula arbitral. A Alstom, então, levou o caso à arbitragem e a decisão final foi em seu favor.
Segundo o advogado da Alstom, Marcelo Ribeiro, a decisão é importante, pois tranquiliza o setor de arbitragem no Brasil. “Caso prevalecesse a tese contrária, os contratos que preveem arbitragem como meio de solução de conflitos seriam cumpridos apenas se as seguradoras assim desejassem.”
SEC 14.930
Por Gabriela Coelho, correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 15 de maio de 2019, 14h58
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Um dos assuntos mais controvertidos atualmente é a vinculação (ou não) dos árbitros aos precedentes judiciais.[1]
Estão os árbitros obrigados a respeitar os precedentes do art. 927 do CPC/15?[2] E se não respeitarem, cabe a ação anulatória do art. 33 da Lei de Arbitragem?
A controvérsia – considerada um “falso problema”[3] – está longe de ser dirimida e exigiria uma obra específica a respeito[4].
De certo modo, essa insegurança jurídica[5] reaviva a constante preocupação acerca do (descabido) controle do mérito arbitral pelo Judiciário.
Como se sabe, o ente estatal, salvo algumas exceções legalmente previstas (arts. 32 e 33 da Lei de Arbitragem), não pode servir como instância revisora dos procedimentos arbitrais, sob pena de esvaziar a própria potencialidade da via arbitral.
Até porque, em que pese a maior autonomia das partes no procedimento arbitral, não se pode perder de vista que a arbitragem é um meio adjudicatório de resolução de conflitos, que compõe um sistema único de jurisdição[6] cuja engrenagem não pode funcionar de forma desarmoniosa.
Com efeito, o exercício jurisdicional não é exclusivo do Poder Judiciário[7]. Logo, é fundamental que haja uma equilibrada simbiose na relação entre Judiciário e Juízo Arbitral.
Como bem destaca CAHALI, “a convivência entre a jurisdição estatal e arbitral sempre foi e continuará sendo fundamental ao desenvolvimento da arbitragem”[8], devendo o Judiciário exercer seu papel de conciliador interinstitucional[9].
Nesse contexto, é preciso consolidar a cultura de uma intervenção judicial mínima na arbitragem.
Assim, compete ao Judiciário, por exemplo, respeitar o princípio competência-competência[10], se eximindo de apreciar conflitos quando houver convenção de arbitragem pactuada pelas partes (com exceção das questões urgentes, sendo que, mesmo nessa hipótese, deve ser verificada a existência de árbitro de emergência). Havendo convenção de arbitragem, deverá o magistrado extinguir o processo sem resolução de mérito, especialmente quando o árbitro já tiver reconhecido a sua competência (art. 485, VII, do CPC/15).
Trata-se de entendimento, há muito, consolidado[11], mas que precisa ser sempre reafirmado.
Da mesma forma, não deve o Judiciário criar barreiras indevidas para o cumprimento de cartas arbitrais.
Nesse sistema de checks and balances, a intervenção do Judiciário no procedimento arbitral só deve ocorrer diante de expressa previsão legal (ação judicial prevista no art. 7º da Lei de Arbitragem para a celebração de compromisso arbitral; concessão de tutelas de urgência, na forma do art. 22-A; cumprimento de cartas arbitrais; execução de sentença arbitral; homologação de sentença arbitral estrangeira; ação anulatória do art. 33 da Lei nº 9.307/96, etc.), ou quando a participação do ente estatal não violar diretamente a competência do árbitro e a jurisdição arbitral[12].
É preciso compreender que o sistema jurisdicional, embora único, possui funções complementares. Não há uma relação de concorrência, mas sim de cooperação entre a arbitragem e o Judiciário. Também não há hierarquia ou qualquer tipo de subordinação, pois os poderes dos juízes e dos árbitros não são idênticos, assim como suas atribuições.
Nesse contexto, o ente estatal deve exercer o judicial self-restraint,[13] valorizando, sempre que possível, a competência do árbitro e não se imiscuindo no mérito da sentença arbitral (salvo quando cabível a ação anulatória do art. 33 da Lei de Arbitragem), mas, por outro lado, não pode permitir ilegalidades[14] e violação às garantias fundamentais[15].
Notas e Referências
[1] No Brasil, ainda não existe um banco de dados de decisões arbitrais. Logo, não faz muito sentido discutir, por ora, a vinculação dos árbitros aos precedentes arbitrais. Como explicam Daniel Brantes e Bianca Farias, fazendo referência à Câmara Nacional de Resolução de Conflitos (CRND), espécie de Câmara Arbitral criada pela CBF para questões envolvendo esporte, “a única área da arbitragem, no Brasil, que possui potencial de desenvolver precedentes arbitrais é a área desportiva, uma vez que o regulamento da CNRD, em seu art. 38, ao tratar da confidencialidade, permite a publicação integral ou parcial de decisões que entender de interesse geral do mercado, omitindo os nomes e qualificações das partes. O § 4º do art. 38 do regulamento também torna o conteúdo das sentenças arbitrais acessível por terceiros com quem mantenha relação de colaboração (…)”. FERREIRA, Daniel Brantes; FARIAS, Bianca Oliveira de. A arbitragem e o precedente arbitral e judicial – uma análise histórica e comparativa entre Brasil e EUA. Revista Brasileira de Direito Processual, v. 102, 2018, p. 171. Vale citar também o “Ementário de sentenças arbitrais” disponibilizado pela Câmara de Arbitragem do Mercado (CAM). Disponível em http://www.b3.com.br/pt_br/b3/qualificacao-e-governanca/camara-de-arbitragem-do-mercado-cam/ementario/. Acesso em: 23.03.2019.
[2] Não adentraremos na discussão sobre a existência de um “sistema de precedentes” no direito brasileiro. Também não examinaremos a constitucionalidade ou não do art. 927 do CPC/15, por não ter decorrido de emenda constitucional. Da mesma forma, não analisaremos as diferentes correntes doutrinárias que divergem sobre a força e a natureza das decisões listadas no referido art. 927.
[3] CRUZ E TUCCI, José Rogério. Os árbitros não são estouvados! (sobre as jornadas de Direito Processual Civil). Disponível em https://www.conjur.com.br/2018-ago-28/paradoxo-corte-arbitros-nao-sao-estouvados-jornadas-direito-processual-civil. Acesso em: 20.02.2019. De acordo com o doutrinador, “toda esta discussão faria realmente sentido se, na prática, os árbitros se recusassem, de forma deliberada e com alguma frequência, a invocar precedentes, vinculantes ou não, no momento em que tivessem de elaborar a ratio decidendi, vale dizer, a fundamentação da sentença arbitral. A propósito, ouso perguntar se algum profissional do Direito, no ambiente ainda restrito da arbitragem, já esteve diante de uma sentença arbitral na qual consignado que os árbitros signatários, de comum acordo, deixavam de seguir determinado precedente porque considerado injusto ou equivocado? Alguém já se deparou com sentença arbitral, na qual, por exemplo, o tribunal arbitral desconsiderou a orientação consolidada no Superior Tribunal de Justiça de que o prazo prescricional para o exercício da pretensão à reparação dos danos causados por fato do produto ou do serviço flui a partir da ciência inequívoca pela vítima dos efeitos do ato lesivo? (…) Conclui-se, pois, que, sob o prisma da praxe arbitral, o debate acerca da questão acima suscitada deixa de ter maior relevância, sobretudo se considerarmos um importante aspecto: a qualidade, a formação e a experiência da esmagadora maioria dos nossos árbitros, que, além de todos esses predicados, têm de ultrapassar duplo escrutínio: das partes e da respectiva câmara!”.
[4] A propósito, AMARAL, Guilherme Rizzo. Judicial Precedent and Arbitration: are Arbitrators Bound by Judicial Precedent? London: Wildy, Simmonds & Hill, 2017.
[5] Para Erika Napoleão, deve-se “assegurar o respeito às decisões arbitrais e manutenção de seu crescente prestígio, sem que isso implique na subtração de garantias fundamentais do indivíduo, que configurarão o norte dos limites da atuação judicial neste âmbito. Com efeito, a sistematização desse controle não só protege a jurisdição arbitral de interferências indevidas por parte do Judiciário, como também possibilita certa segurança àqueles que pretendem escolher esse meio alternativo de solução de conflitos; pois saberão prever e considerar as possibilidades passíveis de ocorrência.” RÊGO, Erika Napoleão do. Impugnação das sentenças parciais e decisões interlocutórias do juízo arbitral perante o poder judiciário – possibilidades e limites. In: CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro; GRECO, Leonardo; PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. (Orgs.) Temas controvertidos na arbitragem à luz do Código de Processo Civil de 2015. Rio de Janeiro: GZ, 2018, p. 71.
[6] PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Jurisdição e Pacificação. Curitiba: CRV, 2017.
[7] “In definitiva, il principio del monopolio statuale della giurisdizione si è vistosamente sgretolato: la giurisdizione non è più esclusiva funzione dello Stato”. PICARDI, Nicola. La giurisdizione all’alba del terzo millennio. Milano: Giuffrè, 2007, p. 53.
[8] Na visão do doutrinador, “esse regime de cooperação ou apoio aparece sob diversas formas, desde a ação para instituição da arbitragem através do compromisso arbitral (em razão de clausula compromissória vazia – art. 7.º da Lei 9.307/1996), até o processo de invalidação de sentença arbitral (interferência de controle e supervisão, não de apoio à arbitragem), passando pela indicação de árbitro substituto, homologação de sentença arbitral estrangeira, execução da sentença arbitral, e pela cooperação do Poder Judiciário ao desenvolvimento da arbitragem.” CAHALI, Francisco José. Curso de Arbitragem: mediação, conciliação e Resolução CNJ 125/10. 6. ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 311.
[9] TAKAHASHI, Bruno. Desequilíbrio de poder e conciliação. Brasília: Gazeta Jurídica, 2016, p. 188.
[10] “A sentença arbitral produz entre as partes envolvidas os mesmos efeitos da sentença judicial e, se condenatória, constitui título executivo. Além disso, tão somente após a sua superveniência é possível a atuação do Poder Judiciário para anulá-la, nos termos dos artigos 31, 32 e 33 da Lei n. 9.307/1996. (…) Consigne-se, além disso, que vige, na jurisdição privada, o princípio basilar do kompetenz-kompetenz, consagrado nos artigos 8º e 20 da Lei de Arbitragem, que estabelece ser o próprio árbitro quem decide, em prioridade com relação ao juiz togado, a respeito de sua competência para avaliar a existência, validade ou eficácia do contrato que contém a cláusula compromissória. A partir dessa premissa, o juízo arbitral se revela o competente para analisar sua própria competência para a solução da controvérsia. Negar aplicação à convenção de arbitragem significa, em última análise, violar o princípio da autonomia da vontade das partes e a presunção de idoneidade da própria arbitragem, gerando insegurança jurídica.” REsp 1.550.260-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 20/03/2018.
[11] “É de se reconhecer a inobservância do art. 8º da Lei n. 9.307/1996, que confere ao Juízo arbitral a medida de competência mínima, veiculada no Princípio da Komptenz Komptenz, cabendo-lhe, assim, deliberar sobre a sua competência, precedentemente a qualquer outro órgão julgador, imiscuindo-se, para tal propósito, sobre as questões relativas à existência, à validade e à eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória”. STJ, CC 146.939/PA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, DJe 30.11.2016.
[12] MAZZOLA, Marcelo; TORRES, Rodrigo. A produção antecipada da prova no Judiciário viola o juízo arbitral e a competência do árbitro? In: FUGA, Bruno Augusto Sampaio; RODRIGUES, Daniel Conalgo; ANTUNES, Thiago Caversan. Produção antecipada da prova – questões relevantes e aspectos polêmicos. Londrina: Thoth, 2018, pp. 337-347.
[13] Como explica Victor Dutra, “a expressão judicial self-restraint foi preconizada pelo Chief Justice Stone, quando proferiu o seu voto dissidente no caso da United States v. Butler, em 1936. Trata-se do fenômeno da autocontenção judicial, que, embora não possua uma definição precisa e admita menos sentidos de conduta em relação ao ativismo judicial, também comporta diferentes significados.” DUTRA, Victor Barbosa. Precedentes vinculantes – contraditório efetivo e técnicas repetitivas. Belo Horizonte: D´Placido, 2018, p.132.
[14] “A tendência internacional e que tem sido acompanhado pelo Poder Judiciário Brasileiro é a do controle efetivo, pautado nos corretos ditames da legalidade estrita, sem preconceitos individuais, sem cometimento de arbitrariedades.” PITOMBO, Eleonora Coelho. Arbitragem e o Poder Judiciário: aspectos relevantes. In: GUILHERME, Luiz Fernando (Coord.). Aspectos práticos da arbitragem. São Paulo: Quartier Latin, 2006, pp.108-109.
[15] Em arbitragem envolvendo ente público, que, a rigor, deve respeitar o princípio da publicidade (art. 2º, 3º, da Lei de Arbitragem), a instituição arbitral negou o requerimento de terceiro para ter acesso às cópias do procedimento arbitral. Em vista disso, o interessado solicitou ao Juiz que oficiasse a referida instituição arbitral remetendo as cópias, o que foi deferido. (Processo 0072675-60.2017.8.19.0001, 37ª Vara Cível da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, decisão proferida em 30.08.2018).
Por Marcelo Mazzola
Fonte: Empório do Direito – 01/05/2019
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Durante o VII Fórum Jurídico de Lisboa, o ministro Luis Felipe Salomão, do STJ, elogiou a utilização da arbitragem para resolução de conflitos e afirmou que ela é “seguramente um caso de sucesso”.
Em entrevista à TV Migalhas, o ministro também chamou atenção para a mediação privada e enfatizou a necessidade de fortalecimento desse método: “é um bom caminho para diminuir essa litigiosidade”. Na entrevista, Salomão discorreu sobre a utilização cada vez maior da tecnologia em favor do Judiciário.
Fonte: Migalhas – segunda-feira, 22 de abril de 2019
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A magistrada do Tribunal de Justiça de Rondônia e atualmente auxiliar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Sandra Silvestre Torres, defendeu, na última sexta-feira, 12, sua tese no Doutorado Interinstitucional (Dinter) em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em convênio com a Faculdade Católica de Rondônia. Intitulado “MAR DE TIMOR: Mediação com a Austrália”, o trabalho foi orientado pelo professor Dr. Paulo Gilberto Fagundes Visentini e estudou o processo de conciliação conduzido pela Comissão de Conciliação da Corte Permanente de Arbitragem (CPA, sediada em Haia, na Holanda) para a resolução do conflito entre Timor Leste e Austrália quanto à delimitação das fronteiras marítimas entre os dois países.
O Timor Leste é um dos países mais novos e pobres do mundo, resultado de anos de guerras civis e exploração por outras nações. Somente em 2002 o país se tornou independente da Indonésia, após 25 anos de uma ocupação que reprimiu a oposição política, deixou mais de 100 mil mortos e acabou destruindo a infraestrutura econômica do país. Após a independência, o país contou com intensos trabalhos realizados por Equipes das Nações Unidas e de programas internacionais para a sua reconstrução. “Mar de Timor é a fronteira final na luta de uma nova nação (Timor-Leste) por soberania e independência frente a poderosos vizinhos”, diz Sandra.
A magistrada ressalta que a Austrália sempre foi um vizinho poderoso e que, em sua história, traz a indelével (e sangrenta) marca do apoio dado à Indonésia por interesse na exploração do petróleo e recursos naturais no Mar de Timor quando da invasão ao Timor-Leste em 1974. No comparativo de indicadores entre as duas nações, destaca-se a distância entre o Índice de Desenvolvimento Humano da Austrália, terceiro do mundo, com o do Timor-Leste, 132º na classificação. “A exploração é estrutural na sociedade capitalista em seu processo de inclusão e exclusão, sendo que a igualdade (e a lógica da desigualdade) está diretamente atrelada ao acesso a bens e riquezas, configurando os ricos e pobres”.
Sandra explica que no sistema jurídico de solução de controvérsias no âmbito internacional não existe uma autoridade suprema capaz de ditar regras de conduta e fazer exigir o seu cumprimento por parte dos Estados e das organizações internacionais, por isso, “busca-se meios e soluções a priori pacíficas dos conflitos, como os diplomáticos (não judiciais), políticos, jurisdicionais ou jurídicos, e coercitivos”. No caso da disputa entre as duas nações, utilizou-se a mediação, conduzida pela Comissão de Conciliação da Corte Permanente de Arbitragem.
Sua tese teve como objeto verificar se os mediadores foram aptos a criar múltiplas opções para as partes durante as negociações, de forma a indicar-lhes possibilidades de ganhos múltiplos, antes de levá-las a decidir o que fazer, e se foram estabelecidos padrões objetivos como base de soluções, a partir dos princípios da Teoria de Negociação de Harvard, utilizada no processo de mediação analisado e já reconhecidamente utilizada em outros conflitos internacionais. “A aplicação do método em um caso paradigmático das relações internacionais entre Estados, de alta complexidade tanto em razão do objeto (fixação de limites marítimos e divisão de riquezas como petróleo e gás) como pela diversidade de elementos que integram o conflito (idiomas e culturas) e pretensões secundárias, abre novas perspectivas sobre os caminhos possíveis para o fortalecimento dos meios alternativos de solução de conflitos no Brasil”, relata a magistrada.
Sobre a finalização da tese, Sandra conclui: “Longa foi a caminhada até aqui, porque aliar a academia com o exercício das funções profissionais e familiares é um desafio, que não teria sido possível sem o apoio institucional da Emeron e do TJRO. Agora é fazer valer todo o investimento da instituição, compartilhando o conhecimento agregado”.
Fonte: Assessoria de Comunicação – Emeron
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